Muito pau, pouca buceta
ou
(Quase) Tudo sobre minha mãe
Visito minha mãe
com uma frequência que, reconheço, deveria ser maior. Ela, já com noventa anos,
reclama que não a vejo mais vezes. E não
é só visitar por visitar, ela sempre mostra que ainda tem muito a me ensinar. E
eu, claro, para aprender. Outro dia me contou que agora ao lado do sobrado onde
mora instalou-se um puteiro. Sim, é dessa forma que nós, da Hulha Negra, nos
referimos aos lugares onde mulheres trepam por dinheiro, com vários homens,
várias vezes no mesmo dia. Pensei cá comigo, minha mãe já deve estar caducando,
coitada... Mas, nas poucas horas em que fiquei em sua companhia mateando
devagarinho na sacada do sobrado percebi que muitas motos, essas que chamamos
de moto-taxi, chegavam na tal casa e descarregavam muitas mulheres, ou saíam
dali com outras tantas.
Minha mãe mora
no centro, na faixa que a prefeitura chama de zona (?) residencial. A tal casa,
essa onde se estabeleceu o puteiro, não é muito grande, quase não tem pátio.
Vê-se, passando ao largo, que acomodaria com certo conforto uma família
composta por um casal e uns dois filhos, por aí... No entanto, sem o alvará dos
bombeiros (coisa que está na moda) e outras licenças que o caso – e a casa –
exigiriam, o lugar mantém um ritmo frenético do entra e sai (estou falando de
pessoas, é claro) que dá gosto de ver.
É um festival de
carros com placas de cidades vizinhas manobrando, buzinando, saindo e
estacionando – inclusive - em frente à casa de minha mãe, e as tais motos –
essas que carregam coisas de comer - entregando ou levando muitas damas sabe-se
lá para onde.
Mas, do alto de
seus noventa anos, minha mãe que ainda insiste em morar sozinha, me explicou
que isso é por causa do Polo Naval.
- É muito homem,
meu filho, eles vêm de longe, deixam as suas mulheres e as suas famílias em
suas cidades de origem porque precisam trabalhar no Polo. Li no jornal que já
são milhares. Todos de muito longe. E virão mais, segundo informou hoje na
televisão. É o desenvolvimento chegando, continuou ela, o tal crescimento de
que falam os políticos. Mas vê bem, meu filho, eu disse crescimento, não o
desenvolvimento social que o teu pai tanto falava e tanto almejamos. E arremata
com um ar de quem já viu de tudo nesta vida enquanto mais uma moto chega na
casa ao lado trazendo na carona uma moça com cara de uns dezesseis anos:
- É muito pau
para pouca buceta, meu filho...
20 comentários:
Tchêêê Vaz, muito boa a cronica, nossas mães, velhas senhoras, e por causa disso muito sábias pela experiência que adquiriram em suas longas jornadas, como diz o ditado, "conhecem o cego dormindo e o rengo sentado". Não dúvida de que ela esteja realmente certa.
Caro amigo Luiz Carlos, adorei tua exposição de um magnífico texto, sabe até consegui rir muito, de verdade. Beleza pura!!!!! Com um grande abraço. Oh!!!! ia esquecendo passei a ser um dos teus seguidores, OLHA LÁ. OK José Pedro Granero
Caro amigo Luiz Carlos, parabenizo-o pelo texto, brilhante. Grande abraço. Saliento que faço parte do teu blog como seguidor. José Pedro Granero
Essa mulher sabe tudo, Gerson...
Gracias, Granero, és agora nosso seguidor número 206.
Tchêêê José Pedro Granero, sejas bem vindo, puxa um banco vai sentando e enriquece nossa charla com tuas experiencias, um baita araço xirú velho.
Vaz, desinfetando a afetação da correção política(argh!), contra a bundamolice geral.
Excelente! com a raça charrua na ponta da chuteira.
Abraço.
Obrigado, Ângelo. Num dia decisivo para o Xavante, tá tudo na ponta da chuteira mesmo...
Pois, Vaz...
Eu, também, não poderia deixar de vir aqui te parabenizar por esta bela narrativa. E viajei por essas cenas surrealistas (?) que pintas -e muito bem - com o colorido espontâneo pincel das palavras. Confesso que ri e igualmente filosofei "assistindo" às tais cenas de "crescimento"... Enfim, trouxe-me ainda risos e saudades, o dito popular que o guri Gerson bem relembra, levando-me a tempos longínquos - quando a vida era ainda calma porque o boizinho era manso... Lá, reencontro minha mãe, minhas avós, minhas tias e velhas amigas da família - com sua singular, aguçada e mui distante sabedoria (filosofia) de vida!!
Com abraço franciscano para todos!
JJ!
Gracias, JJ. Refleti, claro, no uso dos termos mais diretos, mas não tinha como explicitar o dito da minha mãe com reticências ou sinônimos baratos que não se aplicam a sua franqueza. Acho que os leitores entenderam e tornaram a postagem a campeã de acessos da semana.
(Escrevi outro texto, dentro dessa linha, para a primeira edição do novo jornal da Hulha Negra, mas até agora o Joanes Araujo não me mandou o tal número UM. Só vou publicar depois de receber o jornal que já tem mais de um mês...)
Enquanto o trabalho corre por aqui, uma paradinha para um chazinho quente, ler e rir muito com esta crônica. Minha tarde fluirá melhor, rsrsrs. Abraço!
Carpe diem, Tanise!
Obrigado por ler, gostar e comentar.
Um abraço
Vaz
Mas bah Vaz, os puteiros tanto os de Bagé como os da Hulha Negra sempre foram a alegria da gurizada.
Amigo Vaz, pois é tche, os puteiros sempre foram a alegria da moçada, não importa o local, Bagé ou Hulha Negra, e dá-lhe safadeza.
No caminho do Aero Clube, Miro, rsrsrs
Oi Vaz,
passei um tempinho sem o Velha Guarda, e é justamente daí que sai o mais novo.
Sempre é assim, quando se desenvolvem esses grandes projetos que envolvem obras. Contadas e recontadas, as putas, como a história, não se acabam. Mudam as modas, mas o ofício é o mesmo. Resta saber: se houvesse educação e emprego para todos, seguiria com tal força a vocação?
grande blog, grande abraço
E mais:
Vai visitar mais vezes a tua mãe, cara! Aos 90 anos, e sábia como é, há que aproveitá-la.
Sábio conselho, Helena, mas, claro, temos que descontar um pouco da ficção necessária ao texto.
Bj, Vaz
Pensei que ia tecer comentário sobre o filme do Almodóvar , da qual sou fã e para minha surpresa fiquei fã da tua mãe e do teu blog!
Pois veja só, Tônia, aos 93 ela é realmente meio Almodóvar. Um abraço, e obrigado por visitar e comentar neste Blog que ficou meio de lado com o facebookismo dos internautas.
Vaz
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