9 de agosto de 2025

Meu Quixote no Pequeno Inventário de Plateias


 

Luiz carlos Vaz (*)

Conheci através do Instagram um grupo chamado “Pequeno Inventário de Plateias - Cinemas de Pelotas”. Como o cinema é um tema que me interessa, comecei a seguir, fui fazendo alguns comentários nas publicações, até que um dia o pessoal entrou em contato comigo e me pediu um depoimento. Puxa, eu não podia negar... O tema era o de uma crônica que publiquei num dos meus últimos livros, sobre um filme que tentei assistir no antigo Cine América, lá em 1976... Sim, tentei, pois logo na primeira parte faltou “luz”!

Séculos depois, num domingo de manhã, a minha amiga Mirian Iost me mandou uma mensagem com uma foto do Cine América; conversamos sobre o que ela queria saber, e lembrei que nunca mais havia me encontrado com o filme de Arthur Hiller, O Homem de La Mancha.

Era domingo, acessei uma dessas coisas que chamam de “streamings” e achei o filme! Fiz meu mate, e num obsequioso silêncio de 8 horas da manhã, me reencontrei com o valente Cavaleiro Quixote, a belíssima Aldonza e o Sancho. Ah! E com os temíveis Moinhos Gigantes...

Fernanda Machado, L.C. Vaz e a ilustração da Artista

Esta semana recebi o convite para a abertura da Exposição, pois minha narrativa foi uma das escolhidas, e mais, foi ilustrada com uma criatividade digna da grandeza dessas figuras todas, pela artista Fernanda Machado. Ontem, na exposição, tive o prazer de conhecê-la e conversar bastante sobre essas coisas todas. E hoje, literalmente, “trocamos figurinhas”: autografei a ela meu livro MEMÓRIAS DE UM MAU TEMPO (edições Ardotempo, Porto Alegre 2023) - onde está publicada a crônica, e ela me presenteou com uma Gravura feita na técnica de monotipia em vidro. De inhapa fiz amizade com a María Isabel Anita Carmen de Jesús Vargas Lizano, ou... para os íntimos, Chavela Vargas, que aparece numa das fotos junto à Roberta.

"Trocando figurinhas", e a Chavela posando para a foto!

Mas... a canção entoada pelo Cavaleiro da Triste Figura e seu fiel escudeiro, Sancho, até hoje não sai da minha memória... “Ouçam bem a história que vou lhes contar/ De um mundo injusto e cruel/ Um senhor cavaleiro de nobre ideal/ Empunha sua lança no ar/ Eu sou eu, Dom Quixote/ Senhor de La Mancha/ E o meu destino é lutar/ Pois quem não se aventura/ Com fé e ternura/ O mundo não pode mudar/ Não pode o mundo mudar/ Quem não se aventurar/ Sou Sancho! Sim, sou Sancho!/ E hei de servi-lo sempre assim/ Eu juro que me orgulho/ Escudeiro até o fim/ Infiéis, imorais e serpentes do mal/ É chegada a hora da lei/ Pois o dia raiou com esperança afinal/ No mundo que eu sempre sonhei/ Não pode o mundo mudar/ Quem não se aventurar...”

Em tempo, a exposição que inaugurou ontem, 8 de agosto, pode ser visitada até o dia 8 de setembro, no Espaço de Arte Daniel Bellora, na rua Três de Maio, 1005 – Pelotas, (53) 4001-2225. 

Dica: Tem pipoca no local !

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(*) Luiz Carlos Vaz é Jornalista, Fotógrafo, Escritor e Editor deste Blog


2 de agosto de 2025

Honrando a Pátria

 

Ilustração de Samuel Walters, pintor inglês (1811-1882)


Henrique Pires (*)

 

Era agosto. Mais precisamente, dia 24 do ano de 1848. O Brasil havia encomendado da Inglaterra um barco de guerra – uma fragata – e como a encomenda estava pronta, foi enviado o então Capitão de Mar e Guerra Joaquim Marques Lisboa para fazer os testes de praxe e depois conduzir a nave ao Brasil.

Lisboa tinha 41 anos e havia sentado praça na Marinha aos 14, como voluntário, e já era, naqueles tempos, um dos mais destacados oficiais navais brasileiros. Dom Afonso foi o nome dado ao moderníssimo barco que seria entregue aos brasileiros, movido a vapor. Num autêntico “test-drive” zarpou do Porto de Liverpool para o passeio e entrou oceano adentro naquela brumosa manhã britânica.

Mas era agosto, sempre é bom lembrar.

O Capitão Lisboa, gaúcho da cidade de Rio Grande, ia conduzindo a nova fragata, que zingrava repleta de convidados ilustres do governo brasileiro, como Dona Francisca, irmã do Imperador; seu esposo, o Príncipe de Joinville; a Princesa das duas Sicílias e seu esposo Duque de Aumalle; dentre outros tantos que desfrutavam da excursão experimental. Eis que um marinheiro avisou que – ao longe – dava para ver um enorme barco incendiando. Lisboa ordenou que corrigissem o rumo e foi até o local da fatalidade, onde ardia em chamas o Ocean Monarch, um moderníssimo navio de carga construído em Boston e navegando há apenas um ano com a bandeira norte-americana, levando 396 pessoas – àquela altura, em pânico – a maioria imigrantes que deixavam o Velho Continente com destino aos Estados Unidos da América.

Com o navio incendiando, 60 pessoas já haviam se jogado ao mar, outras tantas permaneciam em meio ao fogo e às espessas colunas de fumaça negra que em pouco tempo tomaram conta de toda a enorme embarcação que zarpara naquela mesma manhã. A ação do futuro Almirante Tamandaré, o capitão Lisboa, resultou no salvamento de 160 pessoas embarcadas, mais os que estavam no mar.

Outras embarcações deslocaram-se para ajudar, sendo os brasileiros responsáveis por conseguir salvar em torno de 200 pessoas. A fatalidade vitimou mais de 100, que sucumbiram em meio ao desastre.

Dom Pedro II, quando soube de tudo, ficou tão impressionado com a bravura dos marinheiros brasileiros que imediatamente determinou que um prêmio de 100 libras (uma pequena fortuna na época) fosse rateado entre os tripulantes do Dom Afonso.

Aí o mundo teve a oportunidade de conhecer mais um ato que honrou o Brasil: os tripulantes, por conta deles, decidiram que o dinheiro seria repassado para aquelas pobres famílias sobreviventes, que perderam seus bens materiais todos no naufrágio do Ocean Monarch. Assim foi feito.

Eram outros tempos. Naquela época, honrarias não eram vendidas por militares em lojas de penhores e os nossos líderes em viagem orgulhavam nosso país. Outros tempos, mesmo.

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(*) Henrique Pires é jornalista e historiador.