19 de março de 2010

O Almanaque do Jéca Tatu


O autor do Sítio do Picapau Amarelo chegou primeiro às crianças
através da persnagem do Jéca Tatuzinho


Politicamente incorreto hoje, o Jéca, que curou-se do amarelão,
passou a fumar charutos "fabricados especialmente para ele"


Uma leitura certa de todos nós, já bem antes de ter entrado para o Estadual, era a do Almanaque do Biotônico. O Almanaque, que trazia curiosidades, as fases da lua, frases de homens célebres (nessa época as mulheres não falavam...), tinha, como seu principal conteúdo, a história do Jéca Tatuzinho, de Monteiro Lobato. 

O Jéca, assim, com acento agudo no "e", foi baseado no personagem do mesmo nome de um dos contos do livro Urupês, de Lobato, publicado em 1918. Lobato tinha uma imagem muito negativa dos caboclos paulistas, abandonados pelo poder público, doentes e sem iniciativa. Só depois de herdar uma fazenda foi que Lobato, em contato direto com esses jecas, mudou seu pensamento sobre eles. 

A história do Jéca Tatuzinho encantava a toda criançada. Um pobre caboclo vivia com sua família no meio do mato. Doente e com "amarelão", até seus animais eram anêmicos. Um dia um doutor que passou por perto de sua casa e procurou abrigo por causa da chuva, conheceu o Jéca e receitou-lhe Maleitosan Fontoura e a Ankilostomina Fontoura... e pronto. O Jéca ficou curado de tudo. A receita não parava por ai. O doutor também receitou purgante de sal amargo "se duas horas depois de tomar a Ankilostomina não tiver evacuado..." O Biotônico então, bah! fez até o Jéca matar uma onça com um soco. Bem, nessa época também não havia ainda o Ibama. 

O interessante é que, ao final da história, Jéca, que segundo dizem, morreu aos 89 anos, havia trazido dos Estados Unidos a Televisão e tudo funcionava em sua fazenda na base da Eletricidade e com Controle Remoto. “Era só apertar um botão lá no escritório da fazenda e o cocho dos porcos se enchia automaticamente”. Conselhos de saúde à parte, o Jéca, conforme vemos na ilustração, passou a "fumar charutos fabricados especialmente para ele"

O Almanaque do Biotônico, que foi editado pela primeira vez em 1920, em 1941, chegou aos 10 milhões de exemplares distribuídos nas farmácias de todo o Brasil. Consta que em 1982 foi feita uma edição de 100 Milhões de exemplares só para distribuição naquele ano. Numa linguagem positivista, Monteiro Lobato mostra aos leitores que, além de tomar o Biotônico Fontoura, "era preciso avaliar um país não só pelo tamanho e pela quantidade de seu povo, mas pelo trabalho que realiza e pela qualidade de sua gente". A frase mais famosa de Lobato é que "um país se constrói com homens e livros".
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6 comentários:

Léli disse...

O pai e a mãe sempre falam no Jéca Tatu. E por conta destas cabocladas e de outro caboclo também muito famoso eu sempre assisto os filmes do Mazzaropi. O que me encanta é a ingenuidade do jeca e a consciência, política e cidadã que ele transmite em seus filmes, chegando a tratar com graça e, ao mesmo tempo, seriedade temas como o preconceito racial, contra a mulher e os pobres.
Quanto ao Monteiro Lobato, me gusta mucho o Sítio do Picapau Amarelo, mas fiquei muito chocada quando descobri que ele era racista e tinha um plano de branquiamento para o país. Meus cabelos vermelhos tingidos ficaram em pé ao ler uma história que falava coisas do tipo, utilizar produtos que ofereciam tratamento para os cabelos crespos e que causavam a esterilidade de quem o usava.
Pelo sítio, nota dez, pelo racismo, idependente do período, zero.

Luiz Carlos Vaz disse...

Mas é impressionante perceber como Lobato "via" o futuro. No livro "O presidente negro" (1926), ele imagina, numa história de ficção, um aparelho que vê o futuro. Nesse futuro ele vê nos Estados Unidos uma eleição entre um conservador branco (Mc Cain ?) uma mulher (Hillary ?) e um candidato negro(Obama?). Esse Monteiro Lobato, hein?...

José Maria del Rey Morató disse...

Cuando yo era niño -hace más de sesenta años- mi padre me dio a leer un libro de cuentos de Monteiro Lobato.
Tenía tapa de cuero de dos colores: verde oscuro y ocre; repujada. Tenía, además, un cordón de cuero, chato como una cinta, para marcar la página cuando uno dejaba de leer.
Era un libro caro, editado, creo, en Buenos Aires, de seguro en los años ´40.
Mi padre era profesor de Literatura y Médico.
Yo soy Abogado y escritor de cuentos: ¿será porque hace más de sesenta años mi padre me dio a leer un libro de Monteiro Lobato que era Abogado y escritor de cuentos?
Cosas de la vida: ahora me encuentro con el artículo del Mestre Vaz sobre Monteiro Lobato: gracias amigo.

Luiz Carlos Vaz disse...

Que importante depoimento, Dr del Rey. Vejam só, Monteiro Lobato influenciando jovens leitores na década de 40 em Montevideo. E que boa memória, o livro, pela sua descrição era realmente uma edição de luxo. E, pelo que podemos constatar, Lobato cumpriu seu papel...
José Maria del Rey já publicou, entre outros livros, Llevo cuentos e La Valija, este último sobre as guerras entre Blancos e Colorados durante 133 anos em um país que tinha 135 de independência...Um grande abraço, e siga comentando no nosso Blog.

Unknown disse...

Lembro perfeitamente dos tres:
1- O Almanaque
2- O Jéca
3- O Biotônico
E lhes asseguro que todos tiveram importância bábara na minha vida.
O almanaque pela informação nova e inédita e pela facilidade do acesso.
O Jéca pelo exemplo primeiro de como não se fazer as coisas, e depois corrigido, em como se fazê-las.
E o Biotônico. Ah velho e grande biotônico Fontoura. Fortificante que bastava uma colher, porém sempre exagerávamos na dose. E a garrafinha com tampa metálica de rosquear era utilizada posteriormente para guardar a:

Rude bebida campeira
sumo de cana esmagada
China maula desgraçada
que meus penares encharcas
Jamais se apagam as marcas
de teu fascínio maldito
que faz virar num proscrito
o mas bagual dos monarcas

A canha, do velho Jayme Caetano Braun.

Luiz Carlos Vaz disse...

Mas Bah! índio véio, lembraste uma bela utilidade para os vidros usados do Biotônico... Esse é o Pedro, bagual xucro lá do Itaimbezinho...
E... ninguém cantou melhor o Rio Grande em versos como o velho Jayme...
Forte quebra costela, tchê! (como aquele do Jéca na onça pintada depois de tomar o dito)