Athos Ronaldo Miralha da Cunha (*)
A palavra distopia estava
somente nas orelhas dos livros de ficção. Mas em maio deste ano vemos a
realidade de um mundo distópico aqui nas plagas do Sul. E custamos acreditar
que esteja acontecendo. O caos se instalou no Rio Grande e sobrou uma única opção:
resistência.
Resistiremos de todas as
maneiras e formas porque precisamos sobreviver. Nós somos sobreviventes da
pandemia, sobrevivemos a tentativa de golpe e a falta de humanidade no auge da
Covid19. O povo brasileiro e agora, especificamente, o gaúcho, traz esta garra
de resistência e sobrevivência.
Os gaúchos estão
resistindo, bravamente, as consequências do aquecimento global. Estamos
resistindo porque temos que reconstruir o estado. Reconstruir nossas vidas e
seguir “tocando em frente” dentro do possível. Renascer com a força dos
Farroupilhas, dos Chimangos, Maragatos e dos caudilhos nas cavalarias e nas
peleias nas revoluções. Hoje, somos todos centauros nas coxilhas.
Os nossos pais e avós
resistiram às águas de 41. E são tantas as lembranças em P&B nos antigos
álbuns de fotografias. Naqueles tempos não se falava em negacionismo climático,
mas as águas de 41 voltaram em 24 e com mais ganas de ocupação, amparadas neste
negacionismo.
E o símbolo da
resistência das águas revoltosas de 2024 é justamente um cavalo. Carinhosamente
batizado Caramelo.
Ele permaneceu no telhado
de uma casa em Canoas, lutando para sobreviver diante das implacáveis águas que
subiam sem dar um “Ó de casa”. A coragem do Caramelo rodou o mundo. E foi uma
torcida muito grande para o seu resgate.
O Caramelo permaneceu no
alto daquela estranha coxilha de duas águas de Brasilit. Estranha aquela Pampa
totalmente encharcada de águas turvas.
E o Caramelo lá em cima
do telhado, quatro dias de resistência silenciosa. Imóvel... Impávido...
resistiria até o último suspiro.
Então, os heróis desta
tragédia climática entram em ação. O Corpo de Bombeiros de São Paulo assumiu a
missão de salvar o cavalinho e a expedição Caramelo foi um tremendo sucesso.
O resgate de Caramelo é
um lembrete da resiliência da vida em meio à adversidade. Enquanto as águas
subiam, ele permaneceu firme, aguardando a ajuda que finalmente chegou. Um
cavalo no telhado nos faz lembrar da importância de solidariedade e compaixão
em situações adversas. Caramelo sobreviveu e tocou nossos corações com sua
força e determinação.
Caramelo, o cavalo
símbolo da luta pela vida em meio ao caos de um mundo distópico. Símbolo da
resistência para seguir na jornada por este Rio Grande de São Pedro.
Vai Caramelo.
“Rasgando a coxilha ao meio, mordendo o vento na cara”. [*]
[*] Versos de Potro sem dono – de Paulo Portela Fagundes.
(*) Athos Ronaldo, que é um santamariense por adoção, é um filho de ferroviário que nasceu em Santiago e estudou engenharia na UFSM. Foi funcionário da "Caixa", participou de algumas antologias, publicou vários livros de contos e já recebeu vários prêmios literários com eles. Esta crônica, o Zapzap das flores, está no recente Em prosa e verso, volume XIII, da Academia Santamariense de Letras. Athos, um colorado convicto, também está presente no livro de crônicas O gol iluminado, publicado em 2009.
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