Fatias de Tupy numa produção super fashion |
Em casa, quando éramos pequenos, comíamos tudo que a nossa mãe colocasse à mesa. Desde a obrigatória sopa de legumes, que hoje seria chamada de “entrada”, até as variedades da “comida seca”, como chamava lá em Bagé o Dr. Agostinho, a tudo que viesse depois da sopa servido junto com o arroz, que poderia ser uma carne frita de panela, um ensopado de batatas, uns bifes de fígado, uma rabada, uma bela linguiça caseira, um guisadinho de couve, o bom e tradicional espinhaço de ovelha, galinha assada em pedaços e outras cositas mas.
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Na sobremesa estariam sempre presentes os produtos de época como mogango cozido, batata doce ou angu de farinha de milho, tudo isso acompanhado de um bom copo de leite gordo da nossa vaca jersey, a Cabrita. Frutas, só as colhidas no próprio quintal. Nas épocas correspondentes saboreávamos laranjas de umbigo, bergamotas, caquis, marmelos, uvas, peras, ameixas, pêssegos, butiás... e ainda nos valíamos de frutas silvestres como pitangas, maracujás, araçás... e por vezes lembro que a criançada cavava no pátio mesmo uns bulbos de trevo (?) que tinham um gostinho ardido como o das romãs, que manchavam nossas roupas de lilás. Minha mãe preparava (e ainda prepara) doces em pasta com tudo que fosse produzido em excesso. Num panelão com açúcar, que passava as tardes no fogão à lenha, tudo virava “marmelada” que, acondicionada em embalagens apropriadas, durava meses e surgia, de repente, num belo dia de inverno para adoçar nossos cafés da tarde que muitas vezes enchiam uma enorme mesa na companhia de primas e primos.
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Não muito adepto dos marmelos assados, resistia muito a esta "iguaria". Minhas irmãs, numa estratégia até hoje muito comentada, batizaram o marmelo assado de Tupy para que eu – aí sim – o apreciasse como ninguém. Elas fatiavam o marmelo assado em tirinhas que – transformadas em Tupy – tornavam-se uma verdadeira delícia.
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Ainda lembro da época em que as cinzas de um vulcão chileno foram responsabilizadas por acabar com os marmeleiros aqui no Estado. Hoje, por estas bandas, o Marmelo é considerado uma fruta tipicamente uruguaia. Me esforço em recuperar esse nosso cultivo de marmelos que foi grande na região e, sempre na época da colheita, levo um bom cesto para minha mãe. Ela então prepara uma travessa de Tupy para que eu possa voltar, pelas asas do sabor e do aroma, aos tempos da minha infância, tempos em que se comia o que as mães mandavam, ainda que para isso algumas coisas precisassem ganhar um novo nome, como o Tupy.
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9 comentários:
Lindas memórias, "gordo véio"!!!
E essa... lembras?
Abraço!
Tchê Vaz, que lindo texto, tchê vivente me lembrei de quando era guri, era bem assim, não tinha essa de não gosto disso e não gosto daquilo, inclusive ao lado do velho Hugo tinha lugar à mesa um relho que no cabo estava escrito eu gosto de tudo, e tu? E as nossas mães não tinha preguiça de cozinhar o dia todo se fosse preciso. Hoje em dia muitas mães levantam as 11:00 e mandam os filhos comerem salgadinhos porque não estão afim de irem para a cozinha.
Belas lembranças de outro tempo... E cheias de "sabores"! Adorei o post!
abraço
Alô, Doutel, um abraço e obrigado!!!
Realmente, nosso prato predileto era o "fundo, e bem cheio"... e lembro também o mondongo com pirão, o guisado de cenoura, ou, quando o pai ia pescar, fritada de lambari, traíra à escabeche, jundiá ensopado, e até às vezes - naquele tempos pouco ecológicos - uma mulita gorda, capincho... não, na época fast-food era só um sanduíche de mortadela no café da tarde. Bons tempos...
Sim, Vera, o apelido dado a mim pelo Tio Nini (um tanto profético... rsrsrs)
Mas bah! Gerson, o "seu" Hugo sabia tudo de pedagogia/filosofia/psicologia... deve ter sido conselheiro do Analista de Bagé, hahaha
Pois é, José Luiz, o que pode ser melhor que Um filé de Traíra? Dois? O "mondongo" me causava náuseas... para mim, ainda hoje, o melhor mocotó é o que NÃO leva tripa gorda, pata, mondongo... ou seja, uma bela sopa de feijão branco, rsrsrs
Mas bah, também lembrei de muitos sabores! Dá para incluir a canjica com leite, os doces de pera e de laranja, a ambrosia, o arroz com pêssego... Há muito tempo não comia uma marmelada, mas prá quem gosta aí vai a dica: na estrada Pelotas-Bagé, no armazém à direita, perto da ponte de Piratini (Rincão dos Marmeleiros, se não estou enganada)tem uma muito boa. Matei a saudade dessa iguaria há pouco tempo, em janeiro, quando fui a Torrinhas!
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