Foto LC Vaz |
Que tortura!
Maribel Felippe
Anoitecia quando entrei no ônibus.
Lotado. Último banco, aquele do meio, bem em frente ao corredor, com duas
outras poltronas do lado. À direita, uma velhinha com sacolas. Ao lado dela, o
homem com o celular. À esquerda, a menina com fones de ouvido. Ao lado dela, um
homem dormindo, grudado à janela. O ônibus sacodia. Lotado. Das cinco poltronas
do fundão, eu na do meio. O homem do celular falava. Falava pra todos.
“Tinha o fim do mundo, mas não teve. Era por ciclos. Nas décadas passadas
teve terremoto no Japão, furacão nos oceanos, no Brasil, a ditadura, enquanto
que na Alemanha caiu o muro de Berlin”.
Eram ciclos, ele dizia.
A velhinha, ao lado, só dizia É... é...
“Mas Newton tinha 85 anos quando, querendo desvendar segredos, leu quase
toda a Bíblia, mas, faltando trinta páginas para o fim - do Alcorão - , ele
morreu.”
A minha boca, vermelha de batom, se
fechava, assim como os meus olhos, pra não rir.
Estava divertido e a velhinha só
dizia É... é...
“Absurdo esse ônibus cheio, mas eu meto um abaixo-assinado. Cada
quilômetro de estrada concluída custa ao governo um milhão, mas essa
roubalheira. O Obama disse que o Brasil é o maior país em extensão, mas que seu
único problema é a corrupção. No Uruguai, tu anda na rua e os carros param, mas
aqui não tem educação”.
Pensei que se ficasse de olhos bem
fechados, poderia rir por dentro, porque era divertido. Ao lado esquerdo, na
janela, o outro homem dormia. A menina de fones, ouvia música ruim e comia
horríveis Cheetos de queijo, que
fediam como o fim do mundo. À direita o homem com o celular emendando um
assunto no outro sem vírgulas afirmava narrava previa dizia que Irajá e Anselmo
eram irmãos fazia abaixo-assinados...
Torturada, a velhinha interlocutora
só dizia É... é.
Mas foi então que, chegando ao meu
destino, eu desci...
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Maribel Felippe
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Um comentário:
O pior e Irajá irmão do Anselmo, isso é pesadelo...
Não sei se ia dar certo essa junção, embora não saiba muito das politicas de Pelotas.rsrsr...
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