Diadorim, xilogravura de Arlindo Daibert, 1952-1993 |
Luiz Carlos Vaz (*)
Tudo
já foi dito uma vez
mas
como ninguém escuta,
é
preciso dizer de novo.
Andre
Gide
Para Ricardo Petrucci
Quando
recordamos os “11 de setembro” na história, ou nas nossas vidas, temos sempre
alguns desses dias para lembrar ou comemorar em especial; os fotógrafos certamente
se referem ao do ano de 1816, ano do nascimento de Carl Zeiss, o cara que
revolucionou as nossas lentes; mas há muita gente famosa, claro, que nasceu
nessa mesma data. São de 11 de setembro Theodor Adorno, D. H. Lawrence,
Valentino Fioravanti, Brian De Palma... mas nesse dia a cegonha também trouxe
ao mundo pessoas bem mais populares como Leivinha, Everaldo e Franz
Beckenbauer.
Muitos
acontecimentos, da mesma forma, marcam esse dia. Alguns deles trouxeram sorte
ou alegria para o mundo. Outros, nem tanto. Talvez o mais triste para os tempos
em que vivi tenha sido o 11 de setembro de 1973, quando foi bombardeado o
Palácio La Moneda, em Santiago, e que colocou fim na normalidade institucional
e democrática do Chile. O que veio a seguir envergonha o gênero humano pela
violência, pelas incontáveis e anônimas mortes e sequestros de cientistas,
professores, jornalistas, artistas e intelectuais.
Mas
para enfrentar tudo isso precisamos lutar; lutar muito; lutar com as palavras,
vencer pelo convencimento das palavras, pela explicitação da verdade contida
nas palavras. Nem que se tenha que repetir muitas vezes, pois as pessoas não
escutam...
Talvez nenhum homem ou
mulher – nascido num 11 de setembro, tenha tido tanta garra, coragem e
determinação para viver e lutar por sua causa como Maria Deodorina. Sua vida
foi narrada por João Guimarães Rosa com uma fartura de atos de bravura e
coragem de dar inveja a muita gente metida a valente que anda por aí; tipo os “valentes
de rede social”, como feicibuque, tuíter e uátis, onde se esgotam seus
argumentos e atos de suposta bravura.
Conversando outro dia com
o amigo Ricardo Petrucci, ele me recordou que Ela também havia nascido nesse
dia. Coisa que eu jamais lembraria por ter lido essa história lá nos tempos “da
mocidade”. Deixo então esse pequeno
recorte da obra do João para a apreciação de vocês, sobre o achado do registro
de nascimento dessa mulher que nunca teve medo.
“Aonde fui, a um lugar, nos gerais de Lassance, Os-Porcos.
Assim lá estivemos. A todos eu perguntei, em toda porta bati; triste pouco foi
o que me resultaram. O que pensei encontrar: alguma velha, ou um velho, que da
história soubessem ̶ dela
lembrados quando tinha sido menina ̶ e
então a razão rastraz de muitas coisas haviam de poder me expor, muito mundo.
Isso não achamos. Rumamos daí então para bem longe reato: Juramento, o
Peixe-Crú, Terra-Branca e Capela, a Capelinha-do-Chumbo. Só um letreiro achei.
Este papel, que eu trouxe ̶ batistério. Da matriz de Itacambira, onde tem
tantos mortos enterrados. Lá ela foi levada à pia. Lá registrada, assim. Em um
11 de setembro da éra de 1800 e tantos... O senhor lê. De Maria Deodorina da Fé
Bettancourt Marins ̶ que nasceu para o dever de guerrear e nunca
ter medo, e mais para muito amar, sem gozo de amor... Reze o senhor por essa
alma. O senhor acha que a vida é tristonha?
Mas
ninguém não pode me impedir de rezar; pode algum? O existir da alma é a reza...
Quando estou rezando, estou fora de sujidade, à parte de toda loucura. Ou o
acordar da alma é que é?”
♥ ♥ ♥
♥ ♥ ♥ ♥ ♥ ♥ ♥ ♥ ♥
Em um 11 de
setembro da éra de 1800 e tantos nasceu Maria Deodorina da Fé Bettancourt Marins. Ou terá nascido Reinaldo?
Ou terá nascido Diadorim ̶ “a
mulher dada por Deus”?
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(*) Luiz Carlos Vaz é Jornalista, Fotógrafo e Editor deste Blog
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