9 de maio de 2012

O fogo do inferno nos espera...


Vagando pelas ruas de Roma, a Morte, enquanto não nos leva para o fogo no Inferno,
vai faturando uns Euros, pois sobreviver na Cidade Eterna está pela hora da morte

O fogo do inferno nos espera...

Valacir Marques Gonçalves

Li um artigo que me lembrou de algo que eu não tinha me dado conta ainda: existe mais informação em jornais num fim de semana do que todas as que um investigador da Idade Média tinha ao seu dispor durante toda a sua vida... Não sei se acontece com outros, mas está me incomodando - não aguento mais tanta notícia, tanta dica... Da mesma forma que o “colega” da Idade Média, estou convencido de que não conseguirei absorver tudo o que chega ao meu conhecimento numa vida... São jornais, revistas, blogs, sites, facebook, twitter, emissoras de rádio e televisão (agora com canais de toda parte do mundo), e-mails, mala direta, cartas, panfletos, alto-falantes e todo tipo de estratégia criada para empurrar goela abaixo o que nos interessa, e também o que não estamos nem aí...

Tenho esse receio porque acabo não dispensando nada, virou doença, estou contaminado por essa “virose”... Sou daqueles que leem e-mails a cada meia hora, que ficam realizados quando tomam conhecimento de novidades quase no mesmo momento em que elas acontecem. Num dia desses, fui “flagrado” (por mim mesmo...) escutando rádio, acessando sites na internet e olhando televisão. Alguém pode duvidar, mas tento... Concordo que cheguei ao limite da insanidade: certa vez, estava de olho em todas as mídias quando, em certo momento, enquanto um veículo dava uma notícia, outro a desmentia... Mas continuei atento, garimpando todo tipo de “ruído” para saber quem estava, afinal, falando a verdade. De concreto, só ficou a confusão na minha cabeça...

É muita informação. Todas são discutidas em fóruns lotados de malucos. Verdades absolutas e inquestionáveis logo são desmascaradas. Elas implicam com tudo: devemos tomar cuidado com cerveja acondicionada em latinhas, pois grandes e mortíferas bactérias estão prontas a contaminar quem encostar a boca nas mesmas; uma fábrica já colocou uma película por cima da abertura da lata... Tomei conhecimento, também, que na inocente caixinha do leite, além da data de validade, existem uns misteriosos sinais que dizem quando o leite é perigoso... Aviso de desaparecimento de criancinhas é frequente. Se não o repassarmos para o maior número de pessoas, corremos o risco de sermos torrados no fogo do inferno para sempre...

Para as mulheres também existem dicas incríveis: li num blog que elas não devem deixar caras que saem dos banheiros, em festas, tocá-las de maneira alguma. Que, desde a balada mais brega até a mais chique, é difícil ver homens lavando as mãos, que eles só dão aquela ajeitada no cabelo e “esquecem” de lavá-las. Por isso, elas devem evitar caras que chegam pegando... O castigo para quem não obedecer ao conselho é pegar dezenas de “pintos” por tabela... É um sábio ensinamento...

Fui informado, também, de que eu deveria colocar no lixo a minha amada discoteca em vinil; que era algo pré-histórico, peça de museu. Como quase todo mundo que conheço, obedeci ao conselho e substituí todos os meus vinis por CDs, mp3 e toda a parafernália eletrônica. Até o meu cultuado Chet Baker tocando e cantando My Funny Valentine foi junto... Hoje a internet está dizendo que o vinil está de volta, que “virou cult” escutar música na velha forma, que o som dos velhos vinis é inigualável, e que os maiores artistas do mundo estão lançando suas músicas nos bolachões...

Fizeram-me até acreditar que não precisaria mais ir a restaurantes, que é perda de tempo e um gasto inútil de gasolina. Que era só telefonar e em quinze minutos o motoboy estaria me entregando os mais variados produtos. Mentira! Com o maldito trânsito entupindo todas as ruas, num dia desses acabei jantando, à meia-noite, logicamente uma pizza fria acompanhada de refrigerante quente... É isso aí: não posso mais tomar minha cervejinha em lata sem esterilizá-la; o leite tá perigoso; acabei trocando meus velhos discos de blues e jazz por insensíveis mídias eletrônicas que ficam à disposição do humor do computador.

Estava quase mandando tudo para o inferno e me mudando para Santa Catarina. A ideia foi logo abandonada porque aquele paraíso está inundado de gente que teve o mesmo pensamento, com engarrafamentos, pedintes, motoqueiros, violência, e tudo mais que acompanha o tal modernismo.

Está difícil viver, estou esperando sugestões, de preferência, sem as dicas infalíveis que circulam nas internets da vida...


Valacir Marques Gonçalves (*)

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(*) Colega do Estadual, o Vala, mora em Porto Alegre
e edita o Blog  www.valacir.com
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Foto/legenda: LC Vaz
GIMP na Morte: JL Salvadoretti 
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Um comentário:

Gerson disse...

Tchê Valacir, só nos resta duas coisas, uma sentarmos em volta de uma mesa redonda para discutirmos o assunto, e outra enquanto discutimos tomamos umas geladas, é claro de garrafas. Todavia a discussão não deve ser de tudo isso que nos deixa muito loucos, mas sim o porque que os macacos hora anda eretos, e hora andam praticamente de quatro. O caso que estou propondo é: " que se dane o resto, pois o nosso ideal é viver".