27 de maio de 2012

"Pretinha", a Chuva e Eu...



"Pretinha", a Chuva e Eu...
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J.J. Oliveira Gonçalves

Pois, enquanto vou me escondendo um pouco de mim, em mim mesmo - numa espécie de fuga da realidade - para não ficar o olhar parado "a ver navios", passeio um pouco por meus arquivos, no PC: textos, imagens, música... E, olhando meu álbum de fotografias, encontrei três fotos da "Pretinha" com o mesmo tema: olhando, comigo, a Chuva pela janela, pingos e respingos pela vidraça...
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"Pretinha", então, era ainda uma fofa e curiosa gatinha-menina. Assim, as três fotos me levaram a pouco mais de três anos, pois "Pretinha", agora, está com três aninhos e meio. Por essa época, meus bichinhos - todos - estavam fortes e saudáveis. E eu mesmo me aventurava a algumas viagens (curtas) e prazerosas. Viagens de cunho pessoal e cultural. Belo tempo, ainda... Todavia, por isso mesmo, corto aqui essas saudosas reminiscências. Para o meu bem. Para o bem do meu estado de Alma. Para evitar torturar (ainda mais!) o Espírito. Enfim, para não martirizar meu Ocaso... cinzento e melancólico...
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Mas, como eu dizia - ou escrevia - eram "Pretinha", a Chuva e eu, naquela tarde clara de Outono. Ela olhava com olhos indagadores a rua... Com olhos arregalados - redondos olhos de ouro - aos pingos da chuva na janela... E, com orelhas atentas, ouvia o tilintar das gotas cristalinas que, suicidas involuntárias, estatelavam-se contra a fria indiferença da vidraça... E eu - que há muito descobri que sou filho da Chuva (Oxum) e irmão do Vento (Oxóssi) - falava para "Pretinha" sobre a irmã Chuva... Sobre o fenômeno de Mãe-Natureza. Sobre a melodia compassada que ela nos oferecia... Sobre a Poesia que se fazia concreta naquele momento mágico... Enfim, sobre a Beleza do quadro que Deus pintava com pincéis de água, de Energia e de Mistério...
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Me faz um bem danado "falar" com meus bichinhos-de-estimação. Sei que a eles também. Todos me "respondem" com a mudez significativa do olhar - ou com gestos expressivos que dizem do seu corpo e de sua Alma... Tenho algumas gatas que "falam" constantemente com sons interessantes - sustenidos e bemóis, como costumo dizer - que me encantam e me consolam as Penas de poeta e as Dores de homem-comum! "Pretinha" é uma delas. "Branquinha" também gostava muito de "conversar" comigo... Às vezes, era como se estivesse (e não estaria?) me afirmando alguma coisa... Outras, num tom dengosamente interrogativo... (Saudade sem fim carrego de minha insubstituível e querida amiga "Kika"!!)
Nesta foto e, em mais duas, "Pretinha" ouvia com atenção minha aulinha mui singela e natural sobre a Chuva. Lembro que - menininha - recém começava a conhecer, a experimentar e a se inserir neste mundo feito de Belezas e de Sofreres... 
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Fui professor durante mais de 30 anos. Aliás, os melhores anos de minha vida dediquei ao magistério. Depois que me aposentei, (graças a Deus e a mim), dôo o que sobrou de minhas andanças pelas salas de aula aos meus animais-de-estimação. Sou seu professor, às vezes. Procuro ajudá-los o quanto posso. Outras, eles são meus mestres e sei que muito me ajudam. São filósofos silenciosos do cotidiano que me intuem sobre as mazelas da Vida que ainda não compreendo - e não compreendendo não as aceito. Eles, ah, eles são criaturinhas extremamente humildes, frágeis e demasiadamente resignadas... Solidários. Perdoam com naturalidade e de coração. Me esforço para ensiná-los. Porém, me esforço muito mais para aprender com eles. E, enquanto estiver por aqui, quero desfrutar de suas Lições de Paz e Bem, de Sabedoria e Amor. Sei qual o Laço Sagrado que nos prende, nos une, nos faz Amorosos: é a Consciência Cósmica de que somos - todos! - simples Seres da Natureza! Temos um Único Pai, ou Criador. Portanto, somos, igualmente, filhos Bem-Amados da Mesma Fonte!
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"Pretinha", a Chuva e eu: um flagrante íntimo, interativo, prazerosamente familiar... E um bocadinho desse flagrante, feito de Natureza e de Poesia, é que lhes ofereço, com estas palavras ditadas pelo coração. Pelo coração de um poeta que - "Night and Day" - perambula por suas vielas interiores e trevosas, sempre em busca de amplas e luminosas avenidas... E, nessas filosóficas e utópicas andanças, não dispensa a cúmplice e curadora companhia de seus bichinhos-de-estimação... Eis que eles sabem como pastorear-me a Alma e apascentar-me o Espírito. Este Espírito atribulado e tão desconfiado quanto um abandonado cão de rua...
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JJ Oliveira Gonçalves
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Porto Alegre, 23 de maio/2012. 11h15min
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3 comentários:

Vera Luiza SVaz - maudepoesia.blogspot.com disse...

Lindo ler e perceber a relação amorosa e de entendimento do poeta com os bichanos...
Entendo perfeitamente, amigo JJ!
Leitura fácil e prazerosa, plena de sentimentos e de reflexões, avança pela alma, faz-nos comungar dos mesmos sentires...
A prosa de JJ hoje mostra o poeta um pouco menos triste, eu diria, o que alegra o coração dos amigos leitores.
Grande abraço e parabéns pela escolha dominical, amigo Vaz!

Anônimo disse...

Pois, Vera e Vaz...
Apesar de alguns dias já passados desde a postagem do texto, não deixaria de registrar, aqui, minha palavrinha de agradecimento para vocês. Ao Vaz, pela publicação desta crônica, no "VG" - o que me deixa contente, feliz, pois vejo a divulgação espontânea e fraterna que valoriza meu modesto trabalho. À Vera, pela sinceridade e beleza das palavras que são alento e incentivo para continuar esta complexa Jornada - reticente e cheia de espreitas, de armadilhas... Essa relação amorosa de Paz e Bem com os bichanos é fruto de uma visão de neném - no colo de minha mãe, ou de minha avó materna, ou de meu pai, sobre meus bichos-de-estimação. Desde, lá, nasceu meu fascínio por esses enigmáticos e engraçados, (porque brincalhões), "seres da Natureza". Sou um camarada que gosta "dos animais" e não, apenas, "de animais"... Aí, creio, nessas diminutas partículas, reside uma grande diferença que modifica, claramente, o sentido do verbo... rs... Com certeza, sinto-me feliz vendo esse flagrante - familiar e íntimo - de minha "Pretinha" com seus redondos, atentos e curiosos olhos-de-ouro, como a me perguntar: "o que é isso, papai humano?" A resposta está no próprio texto. Ah, antes que me esqueça: costumo dizer que minh'Alma é uma Alma felina... Alma de gato... Feita de perscrutações, curiosidades, andanças e Liberdade...
Um franciscano e "felino" abraço!
JJ!

Luiz Carlos Vaz disse...

JJ, os leitores do Blog é que agradecem pelas belas crônicas com que nos brindas.
Um abraço
A casa é tua.