Acervo Anabela Medeiros Pires |
Venturino viaja de trem
Paulo Mendes
Ali pelas quatro da tarde, após ter ouvido muitos causos contados pelo próprio Venturino, apareceu um gurizote vestindo uma camiseta do Milan e falou: “Conte aquela da viagem de trem”. Venturino coçou o bigodão, perguntou se havia tempo e lascou: “Essa história é um pouco longa, mas nunca recuso um pedido, já que existe solicitação, não vou me fazer de rogado”. Deu uma pequena tossida e começou.
— Isso faz tempo, quando se podia pegar o trem aqui na Vila Rica no início da noite e amanhecer na Capital. Era um “devertimento”. Fomos eu e o finado Fastanha, ele bem vaqueano, eu, grosso, com poucos conhecimentos de cidade grande. Fomos lá ver os papéis da minha aposentadoria. Bueno, a Odete botou uma muda de roupa na minha malinha de garupa, peguei os avios do mate e me encontrei com o amigo na estação. Dali a pouco, o trem chegou apitando e soltando fumaça pelas ventas. Nos acomodamos num banco e largamos. Os problemas começaram quando vi um parafuso tentando furar minha bombacha branca, de favos. Dei de mão na prateada e tirei o ferro do banco. O Fastanha me alertou, tchê tu tá louco, não pode andar armado na cidade. Respondi na hora, mas isso não é arma, é apenas uma faca que uso pra picar fumo, descascar laranja, será que essa gente da cidade não usa faca?
Nisso, o gurizote começou a rir e eu o acompanhei. Seu Venturino riu das nossas risadas. E prosseguiu:
— Depois da baldeação em Santa Maria, cevei um mate, enchi a térmica no restaurante e fui oferecendo aos vizinhos. Numa curva bem fechada da estrada de ferro, até comentei com o Fastanha, se tiver uma curvita dessas bem bagual eu consigo alcançar uma cuia pro maquinista... Aí sim foi que o pessoal achou engraçado. Até uma gordinha que levava uma criança pra se consultar, pois tinha estourado uma “ursa” que nunca mais sarou. Esse piá, coitado, andava chorão e só se acalmou quando o botei no colo e cantarolei uma quadrinha do Zé da Gaita. “Dorme, dorme, gurizinho, que o bicho vem te pegá, mas se durmi ligerinho, ele nunca mais vai vortá...” E não é que o guri dormiu mesmo, agarrou no sono e só se acordou com o dia clareando.
— E aí seu Venturino, chegaram bem à Capital?
— Era pra chegar. Porém, ao me levantar, descobri que o piazinho que eu nanei, estava de diarreia, sujou toda a minha bombacha...
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Paulo Mendes publica a coluna Campereada, aos domingos, no jornal Correio do Povo
pmendes@correiodopovo.com.br
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Um comentário:
Mas que barbaridade!!!! Foi fazer uma boa ação e saiu cagado. Um baita abraço xirú véio.
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