2 de setembro de 2014

Maravilha!




Winston Churchill, Londres 1940 - Foto: Cecil Beaton

Maravilha!
Por L F Veríssimo



Pode-se parafrasear Winston Churchill e dizer da democracia o mesmo que se diz da velhice, que, por mais lamentável que seja, é melhor do que sua alternativa.

A única alternativa para a velhice é a morte.

Já as alternativas para a democracia são várias, uma pior do que a outra.

É bom lembrá-las sempre, principalmente no horário político, quando sua irritação com a propaganda que atrasa a novela pode levá-lo a preferir outra coisa. Resista.

Engula sua impaciência com a retórica eleitoral que você sabe que é mentirosa, com o debate vazio, com os boatos maldosos e os golpes baixos, com o desfile de candidatos que variam do patético ao ridículo...

Diante de tudo isso, em vez de “que chateação”, pense “que maravilha!”. É a democracia em ação, com seus grotescos e tudo. Saboreie, saboreie.

O processo, incrivelmente, se autodepura, sobrevive aos seus absurdos e dá certo. Ou dá errado, mas pelo menos de erro em erro vamos ganhando a prática.

Mesmo o que impacienta é aproveitável, e votos inconsequentes acabam consequentes.
O Tiririca, não sei, mas o Romário não deu um bom deputado?

Vocações políticas às vezes aparecem em quem menos se espera.

E é melhor o cara poder dizer a bobagem que quiser na TV do que viver num país em que é obrigado a cuidar do que diz.

Melhor ele pedir voto porque é torcedor do Flamengo ou bom filho do que ter sua perspectiva de vida decidida numa ordem do dia de quartel.

Melhor você ser manipulado por marqueteiros políticos, com direito a desacreditá-los, do que pela propaganda oficial e incontestável de um poder ditatorial.

Hoje os candidatos à Presidência medem suas ideias e diferenças livremente, e todos são iguais perante o William Bonner.

Certo, às vezes as alternativas para a democracia parecem tentadoras.

Ah, bons tempos em que o colégio eleitoral era minimalista: tinha um eleitor só.

O general na Presidência escolhia o general que lhe sucederia, e ninguém pedia o nosso palpite. Era um processo rápido a ascético que não sujava as ruas.

A escolha do poder nas monarquias absolutas também é simples e sumária, e o eleitor do rei também é um só, Deus, que também não se interessa pela nossa opinião.

Ou podemos nos imaginar na Roma de Cícero, governados por uma casta de nobres e filósofos, sem nenhuma obrigação cívica salvo a de aplaudi-los no fórum, só cuidando para não parecer ironia.

A democracia é melhor. Mesmo que, como no caso do Brasil das alianças esquisitas, os partidos coligados em disputa lembrem uma salada mista, e ninguém saiba ao certo quem representa o quê. E onde, com o poder econômico mandando e desmandando, a atividade política termine parecendo apenas uma pantomima.

Não importa, não deixa de ser — comparada com o que já foi — uma maravilha.
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Publicado no Blog do Noblat
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