22 de novembro de 2013

Dallas, Texas, urgente! - 50 anos depois.

Numa época já com muitas filmadoras e máquinas fotográficas amadoras
os tiros que mataram o presidente Kennedy foram registrados
 em centenas de fotos, como nesta, obtida no Google


Dallas, Texas, urgente!

Hamilton Caio Vaz

"Naquela tarde de 22 de novembro de 1963, eu estava em casa estudando para as provas finais do 2º ano Científico do Colégio Estadual.  O quartel já havia me convocado para o serviço militar obrigatório, mas eu tinha conseguido dispensa de uns dias para estudar.  Como já era comum naquela época, o rádio ligado ao lado dava ritmo aos estudos.  Com a "era do rock" no auge, eu procurara no "dial" do aparelho um fundo musical mais suave para acompanhar minha revisão para as provas, e então escutava a antiga rádio Guaíba, onde tocava música mais apropriada para essa tarefa.  Era uma miscelânea de Ray Conniff, Lawrence Welk, Sarita Montiel, The Platters..., temperada com o chamado rock balada de Paul Anka, Pat Boone..., muitas trilhas de cinema e algumas músicas brasileiras. 

De repente, a música foi interrompida e entrou o "Correspondente Renner" em edição extraordinária, um noticiário bem conhecido da Guaíba, bradando:  "Dallas, Texas, urgente !", falando sobre um atentado contra o presidente americano John Kennedy, durante um desfile em carro aberto naquela cidade.  E seguiram várias outras chamadas urgentes, cada vez noticiando um quadro mais grave, até a notícia da morte do presidente, pouco tempo depois.  Naturalmente, esse dia de estudos terminou ali mesmo. Toda a minha família começou a acompanhar esse noticiário.  Foram momentos dramáticos, nunca mais esqueci.  Sempre ligado em datas e fatos, tenho relembrado anualmente também essa efeméride.

John Kennedy sucedera outro grande presidente, forjado na 2ª Guerra Mundial, o General Dwight Eisenhower, vindo de dois mandatos seguidos, que continuara enfrentando os duelos da guerra fria que começara logo após o fim da grande guerra, e que conseguira o final da guerra da Coreia em 1953, primeiro ano do seu governo.  Esse nome é o primeiro que lembro de ver nas manchetes dos jornais que meu pai assinava, e que eu lia literalmente em português, "eisenhover".  Eisenhower foi o General comandante supremo dos aliados, com a 2ª guerra já tomando um rumo final.  Kennedy também tinha participado dessa guerra, mas como um jovem Tenente da marinha, era uma nova geração que chegava, cheia de esperanças.

Nós, os jovens daquela época, queríamos um mundo novo, e o Kennedy parecia que representava, como líder da grande nação americana e do chamado mundo livre, um farol que indicava uma nova era de progresso.  O assassinato dele nesse dia, significava para nós o fim dessa ânsia por mudanças.

Também lembro que Juscelino Kubitschek e John Kennedy tiveram doze dias de mandatos coincidentes.  Kennedy assumiu o cargo, conforme a tradição americana, em 20 de janeiro, e Juscelino transmitiu o cargo para Jânio Quadros em 31 de janeiro de 1961, de acordo com a legislação daquela época. Portanto, quando os anos JK encerraram aqui, Kennedy estava há doze dias no poder.

A partir daquela tragédia, o mundo realmente começou a mudar, mas não da maneira como esperávamos com o novo presidente americano.  A Guerra Fria já tinha passado por um grande embate no primeiro ano Kennedy, quando em 1961 começou a construção do muro de Berlim, isolando o lado ocidental da cidade, do lado oriental controlado pelos soviéticos, para impedir a fuga de alemães orientais para Berlim Ocidental.  No ano seguinte estivemos à beira de um conflito nuclear, com a crise dos mísseis em Cuba.  Durante os treze dias que duraram o impasse, de 16 a 28 de outubro, esse era o assunto dominante em nossas aulas no Estadual, com a possibilidade de uma guerra atômica total estourar a qualquer momento.

Ao findar o ano seguinte, a esperança Kennedy sai de cena.   O vice Lyndon Johnson, que assumiu no seu lugar, alargou o horizonte da guerra do Vietnã, que já vinha de alguns anos com alguns confrontos, com o envio de grandes efetivos militares para a área conflagrada, a partir de 1965.  Essa guerra marcou os anos 60 e 70.  Naquela época, parecia para nós estudantes que a morte de Kennedy foi fator determinante para a grande extensão e duração desse conflito.  Com ele no governo, achávamos que a guerra não teria seguido esses rumos.

O final desses tumultuados anos 60 foi pelo menos amenizado, na nossa visão de estudante, com a corrida espacial entre os dois grandes, Estados Unidos e União Soviética, tendo como coroamento a descida do homem na Lua, em julho de 1969, e também porque essa meta da chegada de astronautas ao nosso satélite natural tinha sido planejada e prevista pelo governo Kennedy para o final daquela década.  E, claro, teve também, exatamente no mês seguinte ao da descida do homem na Lua, Woodstock...

Bem, os homens que mandam, mudam; as ideias mudam. Cabo Canaveral, na Flórida, onde estava situado o Centro Espacial, de onde partiam os grandes lançamentos de satélites e naves espaciais, mudou desse nome para Cabo Kennedy, assim como o local passou a se chamar Centro Espacial Kennedy, em homenagem ao ex-presidente.  Dez anos depois, voltou a ser novamente denominado de Cabo Canaveral, e a homenagem foi virtualmente para o espaço, embora o Centro Espacial continue com o nome Kennedy.

Assim como nos dias de hoje, os grandes acontecimentos de repercussão nacional e mundial daqueles anos, que não foram poucos, ajudaram a moldar a nossa têmpera e nosso caráter, para tomarmos o lugar de nossos pais nas décadas posteriores e seguirmos o ciclo da vida.  Hoje estamos investidos dessa responsabilidade de ajudar a mostrar o caminho para nossos filhos, e até para os netos, sempre procurando aperfeiçoar esse mundo, e sobretudo na procura da abolição da violência e na eterna busca da paz mundial."
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Publicado originalmente em 22 de nobembro de 2010, aqui no Blog da VG

O Blog pergunta: 

Onde você estava quando soube do atentado ao presidente Kennedy ?


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10 comentários:

Anônimo disse...

Caro Vaz, eu tinha 13 anos, ouvia "Please, please me" dos Beatles em minha vitrola portátil Phillips. Sonhava com o disco "with the Beatles", lançado em 22 de novembro na véspera daquele assassinato, que só chegaria aqui em 64 sob a alcunha de "Beatlemania".
A tragédia, para mim, não passou de comentários adultos soturnos e desinteressantes, o tal de Kennedy não era um Beatle(ou quase).
O moedor de carne da realidade, ligado em 220 desilusões por minuto, ainda não existia.
O sonho recém começara, apesar de tudo.

Sérgio M. P. Fontana disse...

Com 4 anos recém completados, eu tenho uma vaga ideia que estava com a minha mãe na sala da minha casa (Rua Flores da Cunha,376 - Bagé, RS) de tardezinha - lusco-fusco, porque as luzes ainda nem estavam acesas - quando o meu pai chegou com a notícia.

Hamilton Caio Vaz disse...

Sempre relembro com minha mãe efemérides históricas e familiares. E como esta não poderia faltar, liguei para ela para recordar aquela tarde de novembro de 1963. Perguntei se ela já tinha feito o pão. Ela estranhou a pergunta, mas logo a relembrei que, há meio século, um certo filho mais moço tido saído para comprar fermento na venda do seu Wayne Ela riu. D. Loiracy disse que não lembra se chegou a fazer o pão, mas recorda que aquele guri saiu meio contrariado para fazer a compra, pois estava ocupado com alguma coisa interessante. No mínimo, aquele pão cinquentenário deve ter abatumado.

Hamilton Caio Vaz disse...

Por coincidência, nesse 22 de novembro, era dia marcado para visitar o barbeiro. Como sei que o “Seu Pavão” (José Antônio Rangel Saraiva), que tem o Salão Carioca, bem conhecido em Bagé, já tinha começado nesse ofício naquela época, fui logo perguntando como ele soube do assassinato do presidente americano, pois, como hoje, ele trabalhava em uma tarde de sexta-feira, e ainda num dia muito procurado pela clientela. Ele me respondeu que não tinha rádio no salão (televisão ainda não existia por aqui) e que os clientes e amigos que começaram a chegar ao final da tarde (o fato ocorreu às 15:30 horas, pelo horário brasileiro) já chegavam contando a trágica notícia.

Luiz Carlos Vaz disse...

Eu tinha ido na venda do seu Wayne buscar Fermento Fleischmann para minha mãe fazer o pão do dia. Fiz uma "parada técnica" no sobrado do seu Robaina para conversar com o Jorginho. Quando o rádio deu a primeira edição extraordinária falando nos tiros. Corri logo para casa e todos já estavam falando só nisso e aguardando mais notícias, que vieram logo a seguir, informando que o Kennedy havia morrido em consequência desses tiros.

Anônimo disse...

(Comentário publicado na postagem de 2010)
Minha mãe conta que naquele momento, ao saber da noticia, o leite dela secou. Eu tinha exatos um mês de vida, depois disso, nunca mais mamei.
Marcelo Soares, o Camafunga

Anônimo disse...

(Comentáriuo publicado na postagem de 2010)
Em 1963, eu estava em S.Paulo. Fiquei um ano na casa da tia Malvina(gaúcha de Bagé), que morava na Av. Paulista. Nesse dia saindo da escola, estava andando pela R. Domingos de Morais - Vila Mariana, para pegar o ônibus, ví as pessoas em pânico, algo muito estranho tinha acontecido, mulheres chorando. Resolvi perguntar.
-Mataram o presidente dos Estados Unidos.
Aos 15 anos não ligava para a política, mas sabia bastante a respeito do Presidente Kennedy pelo jornal que meu tio Pantoja (paraense de Belém), recebia todos os dias e pelas notícias da televisão. Fiquei chocado.
Manoel Ianzer

Clara Silveira Luiz disse...

Naquela tarde de 22 de novembro de 1963 eu estava na aula de solfejo do curso de canto, no IMBA (Instituto Municipal de Belas Artes), em Bagé. Enquanto a colega Vera Catarina da Costa Nunes estava cantando, acompanhada ao piano pela professora Dora Donazar, e com a observação da professora de canto Alene Dupont Teixeira, eu e outra colega, a Eny (não lembro o sobrenome, ela é parente da Elvira Macedo), esperávamos a nossa vez no solfejo. De repente, a Eny, que tinha saído uns instantes do local, voltou dizendo que não precisávamos mais esperar, as aulas seriam suspensas, “mataram o Kennedy”, disse ela. Seguiu-se um alvoroço e, efetivamente, as aulas foram suspensas naquela meia tarde.

Hamilton Caio Vaz disse...

Sempre relembro com minha mãe efemérides históricas e familiares. E como esta não poderia faltar, liguei pra ela recordando aquela tarde de novembro de 1963. Perguntei se ela já tinha feito o pão. Ela estranhou a pergunta, mas logo a relembrei que, há meio século, um certo filho mais moço tido saído para comprar fermento na venda do seu Wayne. Ela riu. D. Loiracy disse que não lembra se chegou a fazer o pão, mas recorda que aquele guri saiu meio contrariado para fazer a compra, pois devia estar ocupado com alguma leitura interessante.
No mínimo, aquele pão
cinquentenário deve ter abatumado.

Clara Silveira Luiz disse...

Fazendo uma correção na especialidade das professoras do IMBA (meu secretário trocou na hora de digitar o comentário). A professora de canto é a Dora Donazar e a professora de piano é a Alene Dupont Teixeira.