25 de agosto de 2021

A mulher do Avon

 

                                          Imagens do Google

Athos Ronaldo (*)

 

Eu não sabia quem era o Seu Avon, mas a mulher dele, seguidamente, aparecia lá em casa para uma longa prosa com minha mãe.

Eram amigas, acho que eram amigas desde a infância, minha mãe oferecia chá com bolachas Maria ou um mate doce. Teve uma tarde que elas detonaram uma jarra de Q-suco de morango com bolachas de água e sal. Naqueles tempos não havia o temor da balança e do diabetes. A mulher do Avon era muito querida, trazia revistas que minha mãe folheava, atentamente, e em outras vezes trazia presentes.

Nos dias de visita – muita das vezes na hora do almoço – a mãe comentava que tinha que preparar algo para esperar a mulher do Avon. O pai não gostava dela, achava uma mala sem alça, decerto tinha lá os motivos dele.

Nos meus dez anos o que importava eram os jogos de futebol no campinho próximo da minha casa, andar na Monareta e assistir Bonanza nos finais de tarde. As amigas da mãe eram, apenas, amigas da mãe.

Mas me intrigava o oculto do Seu Avon. Deveria ser uma pessoa importante, tão importante que a mulher dele não tinha nome, era simplesmente a mulher do Avon.

Certo dia a mãe falou que a mulher do Avon estava doente e foi visitá-la no hospital. No dia seguinte a mulher do Avon falecera. Foi um dia muito triste lá em casa, aliás, em toda a vizinhança.

Quando meus pais voltaram do velório perguntei como estava o Seu Avon – aquela pessoa importante que nunca tinha visto –, afinal, eram amigos da nossa família e eu tinha que mostrar um interesse no acontecido.

– Que seu Avon, guri? – minha mãe devolveu a pergunta.

– A mulher dele não morreu? Ele está bem?

Com um semblante ainda triste, minha mãe sorriu e não disse nada.

E eu nunca fiquei sabendo quem era aquele tal de Avon.

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(*) Athos Ronaldo Miralha da Cunha, santamariense por adoção, é um filho de ferroviário que nasceu em Santiago e estudou engenharia na UFSM. Foi funcionário da "Caixa", participou de algumas antologias, publicou vários livros de contos e já recebeu vários prêmios literários com eles. Contos de Chumbo, pela Chiado Editora; Tintos e contos, O código Locatelli e Sofrendo em Paris, pela Penalux Editora, são alguns de seus livros. Athos, que é um colorado convicto, também está presente no livro de crônicas O gol iluminado, publicado em 2009.

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