Réquiem para Ada
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"Nascer,
viver e morrer, tal é a lei".
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Willy Cesar
Rodrigues Ferreira
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Ada, minha mãe,
cumpriu exemplarmente sua missão nesse plano terrestre. Ela nasceu em 17 de
outubro de 1924, na cidade de Bagé. Era a 13a. filha de meus avós Alcides e
Isabel. Os encantos pela arte da poesia brotaram desde cedo. A menina Ada
sentiu necessidade de expor seus sentimentos no papel, manifestas alegrias e
angústias. Sempre que algo a chamava a atenção ela se punha a escrever e a
sonhar. Ao ouvir um violinista tocar, pediu ao pai que a colocasse para
aprender, mas a mãe se opôs. Tolhida em demonstrar pendores para a arte da
música, ela escrevia seus versos escondida, não mostrava a ninguem em familia,
especialmente depois que o pai morreu, quando ela tinha 13 anos incompletos, em
1936. Estudou mais um ano no colégio particular, porém nao concluiu o ensino
fundamental. Veio a Segunda Guerra e ela com as irmãs Nina e Bothia se
apresentaram como enfermeiras voluntárias (hoje seria auxiliar de enfermagem).
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Casou-se fortemente estimulada por sua mãe e, talvez, para dar uma guinada em
sua vida aborrecida em casa, sem estudar. Veio p/ Rio Grande com Anselmo e o
filho de 16 dias, Valdelirio (Mom), em fevereiro de 1945. O casal tinha em seus
braços a única fortuna e no bolso, nada. Anselmo conseguiu alguns cobres em
empregos temporários, numa época dificíl em que farinha de boa qualidade
faltava nas padarias. O pão que comiam era preto, o pão de guerra, que custava
mais barato. Enquanto Anselmo saía para trabalhar, Ada passava horas na fila
para comprar pão preto, com o filho nos braços.
As dificuldades
foram sendo superadas, graças a ajuda de amigos e familiares sensíveis em Bagé,
como a irmã de Anselmo, Ondina, gesto que Ada agradeceu e reconheceu sempre.
Anselmo, por fim, empregou-se na estiva do porto e a familia pode até aumentar.
Em 1948, nasceu o segundo filho, Erlon Jacques. Quando Ada estava grávida do
terceiro, Willy Cesar, em 1956, o casal comprou o terreno de esquina, na
segunda quadra da Vila dos Estivadores (rua Ernani Fornari atual) e construiu
ali a primeira casinha de madeira, com 5 peças, e alugou o imóvel. A familia
foi morar nesse endereço em 1963. Continua sendo até hoje o endereço da familia
Rodrigues Ferreira.
Ada trabalhou
como costureira, cabeleireira e advogada. Depois de educar os filhos e
encaminhá-los na vida, Ada foi completar os estudos de 1o. e 2o. graus
(fundamental e médio), nos cursos supletivos. O sonho era formar-se em Direito,
que foi alcançado em 1979, na Furg. Exerceu a advocacia até os 70 anos, quando
passou a se dedicar somente à cultura. Sua produção de poesias aumentava cada
vez mais. Mas ela nunca deixou de escrever, na verdade. Os primeiros versos
tinham sido escritos aos 5 anos, em 1929, Trovinhas. Em Rio Grande, as
primeiras poesias foram publicadas a partir de 1968, em O Peixeiro. Venceu o
concurso de poesias da Semana de Cultura de 1982 com o poema O amor tem asas.
Em 1994, publicou Passos, seu primeiro livro, lançado na Feira do Livro, da
Furg. Dois anos depois, fundou a Oficina Literária em Rio Grande. No mesmo ano,
vai a Brasilia, onde participou do Concilio de Ética pela Literatura, no
Parlamundi. Mandala verde, em 2002, e O infinito dos sonhos, em 2004, são os
outros dois livros publicados. A produção é imensa, talvez 2,5 mil poemas.
Participou de várias antologias em Rio Grande e Brasilia. Integrava o Grupo de
Poetas Girassol e participava dos eventos do site Papareia. Pintou mais de 200
telas a óleo e deixou a coleção 'Navios', com 24 quadros, a maioria prontos.
Ada nao foi
exatamente feliz no casamento e separou-se de Anselmo em 1976. Teve alguns
namorados, mas nunca se casou novamente. Dedicou-se aos filhos, à cultura e a
filantropia. Fazia roupinhas para as orfãos do orfanato Maria Carmen até o fim
da vida. Morreu em 4 de junho de 2011, vitimada por câncer de intestino. Disse
em um de seus poemas:
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"É o poeta um rezador tenaz
Que veio despertar os corações.
Faz de seus versos tantas orações,
E com eles e os sonhos, oferta a paz!"
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Muito obrigado, Ada.
Willy Cesar Rodrigues Ferreira (*)
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(*) Willy Cesar é jornalista e escritor. Publicou recentemente a
biografia de Francisco Martins Bastos,
fundador das Empresas Petróleo Ipiranga. Também é autor, entre outros, do
livro do Centenário do Colégio Lemos Júnior, de Rio Grande.
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