6 de novembro de 2015

Português normal, vovó!

Montagem sobre foto publicada no Facebook de Marcel Gonçalves Pereira

Português normal, vovó!

Por Marcos Bagno (*)

Tenho um amigo uruguaio que veio com a família para o Brasil ainda criança. Foram morar em Santos. Como todas as crianças, ele e os irmãos logo aprenderam português no convívio com os vizinhos e colegas de escola da mesma idade.

O pai, querendo aprimorar o conhecimento dos filhos, contratou uma professora particular para ensinar português a eles. Poucas aulas depois, Álvaro chegou para o pai e disse: “Pai, das duas uma: ou o que essa professora ensina não é português, ou o que meus amigos falam não é português. O que ela ensina não tem nada a ver com a língua que a gente aprende com nossos amigos”.

Outro amigo, português agora, morando no Brasil há algum tempo e já bem familiarizado com a nossa língua, decidiu se matricular num cursinho para fazer vestibular.

Poucas aulas depois, Rui comentou comigo: “Não admira que os brasileiros digam que português é uma língua difícil: o que se ensina nas escolas é português de Portugal, nada a ver com o que realmente se fala aqui. Para mim é muito fácil, mas para os brasileiros é mesmo um suplício!”

Mais recentemente, uma queridíssima amiga paraibana me contou a seguinte história. Seu neto de quatro anos de idade quis ver um DVD com o desenho animado do Pinóquio, um dos clássicos da Disney.

Como o DVD tinha sido comprado na Europa, só trazia dublagem em português europeu. Tão pronto o filme começou, o pequeno Gabriel gritou: “Não quero em francês! Não quero em francês!”, porque sabia que a avó e o pai tinham vivido muito tempo na França.

Rosalina então explicou: “Não é francês, Gabriel, é português de Portugal”. Ao que Gabriel retrucou: “Não quero Portugal! Quero português normal, vovó!”

Todo esse nariz-de-cera é só para anunciar a minha Gramática Pedagógica do Português Brasileiro. É a primeiríssima obra do gênero que se dedica exclusivamente aos modos de falar e de escrever que caracterizam a nossa língua materna, o português brasileiro, falado por quase duzentos milhões de pessoas.

É a primeira que descreve e autoriza aquilo que já está autorizado há século e meio, senão mais, pela nossa melhor literatura, de José de Alencar a Luiz Ruffato, passando por Machado de Assis e toda a longa fila de grandes autores da nossa língua.

É a primeira que repele sem susto os equívocos da tradição gramatical, cheia de erros teóricos e prescrições absurdas, e se apoia numa teoria linguística coerente e nos resultados obtidos em mais de cinquenta anos de pesquisa científica séria realizada em nossas melhores universidades.

É chato ter de fazer propaganda da própria obra, mas como são poucos os espaços disponíveis para trabalhos dessa natureza, mando a modéstia às favas e deixo aqui esse recado.

Adeus, bobajada autoritária do normativismo empedernido e de seus fanáticos seguidores que têm invadido a mídia brasileira, a podre mídia brasileira, para tentar salvar da extinção os dinossauros linguísticos que o povo brasileiro há muito tempo já despachou para o museu.
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(*) Marcos Bagno é linguista, escritor e professor da UnB - marcosbagno.org

“Adorei Bagé! Tem casas antigas, do início do século XX, bem preservadas. 
Espero voltar outras vezes à Unipampa!”

Observação de Marcos Bagno em Bagé, feita em três de dezembro de 2012 quando palestrou na Unipampa.


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