Cabo da Roca, Sintra, Foto LC Vaz |
Ora agora, vira
Mergulho e morte
Mergulho e morte
Antunes Ferreira
direto de Lisboa
direto de Lisboa
O desastre vinha e
era transmitido em toda a imprensa, televisões e rádios e até no Facebook e no
Twister. Um mergulhador que buscava achar vestígios de um barco afundado no
qual dizia-se que havia um tesouro escondido. O malogrado com um gesto
inesperado e fatal arrancara o tubo da máscara e fora puxado pelo barco de
pesquiza já morto. Imagens da triste ocorrência mostrando o mergulhador, e
declarações dos familiares, sobretudo da mulher e dos filhos todos em lágrimas.
Os repórteres fotográficos enviavam essas imagens de máquina digital via
satélite enquanto os outros de suporte papel faziam quase exatamente a mesma
coisa.
Estava em Braga, numa
viagem turística, com a família satisfeitíssima, e fomos visitar a Sé e a
Senhora do Monte, depois de termos passado por Guimarães para mostrar ao
Miguelzinho o castelo onde nasceu Portugal e o Palácio dos Duques de Bragança.
Alias a minha Tânia também não conhecia nem uma nem a outra cidade e por isso
ficámos lá dois dias e contávamos seguir para Trás-os-Montes e Gerês quando
recebi uma chamada da Ilha do Pico. Tratava-se do Senhor Fernando Flores, pai
do inditoso mergulhador, pedindo-me para me deslocar ali a fim de averiguar o
desastre que roubara Hernâni Flores, pois ele pensava que se tratara de
assassínio.
Tal como fizéramos
à ida tomámos um Aerobus que fazia a ligação entre Lisboa e Porto, no caso
entre Porto e Lisboa, depois de interromper o périplo de férias e eu prometi
que tornaríamos a dar a volta, Aterrámos na Portela e fui tratar da viagem para
os Açores, onde há pouco tempo, coisa de dois meses, tinha estado para
averiguar o caso da mulher enforcada. Cheguei a Ponta Delgada e segui para a
Terceira no ferry-boat que liga as duas ilhas. Era o que Vitorino Nemésio chamar
num dos livros mais importantes da Literatura Portuguesa «Mau Tempo
no Canal». Atracámos no porto da Madalena e
dirigi-me de táxi para a casa do Senhor Fernando Flores onde se respirava um ar
sorumbático com os donos da casa de luto carregado.
Bebemos quase em
silêncio um copo de vinho do Pico, a Senhora Dona Ana ofereceu-me uma chávena
de chá Gorreana e uns bolinhos locais e entrámos, o Senhor Flores e eu no
assunto melindroso da morte do se filho Hernâni, o que lhe fez chegarem as
lágrimas, o que motivou o Senhor Flores a dizer que um homem não é de pau.
Adiante. Tinha ele quase a certeza de o seu filho fora assassinado, apesar do
que diziam um desastre apenas, como se fosse o inditoso Hernâni o próprio
culpado da sua própria morte, o que seria um suicídio… Alias
um homem aprumado e bonito, quer ver umas fotografias dele? Com certeza que
queria. Numa delas estava ele com a mulher e um casal de filhos, tornadas, ela
viúva e as crianças órfãs.
E porquê assassínio?
Porque alguém lhe tirara a máscara debaixo das ondas. E esse alguém seria outro
mergulhador? Tinha a certeza que se tratara de outro mergulhador que mergulhara
atrás do Hernâni e que imediatamente voltara à tona desembarcando sabe Deus
onde. O que era preciso era saber que fora essa figura misteriosa! Prometi
fazê-lo sem margem para dúvidas pois eu próprio sentia na pele o desgosto
deles. Deu-me um bacalhau forte e um abraço e disse-me que ganharia o que eu
entendesse porque eram um tipo abastado. As viagens para todas as diligências
também correriam por conta dele. Homem aprumado e de arcaboiço forte perfilado
como se fosse militar!
Depois de despedir-me
dele, ainda me aconselho a dar uma volta pela ilha para ver as cavernas dos
piratas num táxi dum amigo dele, o João Faustino que era natural do Pico. Assim
fiz e tudo me pareceu interessante. Voltei à Terceira, mais precisamente à
capital Angra do Heroísmo e fui conversar com o compadre dos Flores que o pai
me tinha indicado: o comerciante Manuel Martins que morava quase junto da base
das Lages porque ele conhecia o patrão da firma que tinha os mergulhadores. Ele
informou-me que igualmente tinha quase a certeza que o Hernâni fora assassinado
pois que além do mergulhador misterioso, ele nunca fora homem para suicidar-se,
pois muito pelo contrário amava a vida sobretudo com a família.
Um caso bicudo este que
se me deparava. Palavra puxa palavra ele inclinava-se para o mergulhador
desconhecido que seria um tal Onofre do Espírito Santo. E como cúmplice que o
devia ter ajudado a arranjar a vestir o material de mergulho, desde a máscara
até às botijas de oxigénio incluindo as barbatanas, o Vasco China que toda a
gente o conhecia de ginjeira. Restava agora encontra-los, tarefa que era um
pouco difícil pois que ambos tinham desaparecido, como se tivessem vogado no
ar.
A GNR do Pico começara
as investigações, pois o Pico não tinha Judiciária, mas passara-as para Ponta
Delgada onde o meu conhecido subinspector Medeiros as continuava, sobretudo
para demonstrar que fora um acidente e não um suicídio. Desta feita o Xavier
Pintado, que voltara a Lisboa a toque de caixa, não participava. O Senhor
Flores informara o Medeiros que fora um assassínio e que já se sabia quem era o
criminoso e o cúmplice só que os dois tinham-se eclipsado. Medeiros ficou
convencido e disse ao pai desmoralizado que envidaria os maiores esforços, e
que a Policia Judiciaria iria visitar todas as ilhas da Região Autónoma para
ver se conseguia encontrar - e cito o que disse – os
filhos da puta!
E mais: quando os
caçasse veriam como elas os haviam de morder, pois estava cheio de ódio aos
sacanas, dado que compreendia a dor da família e ainda por cima sabia de
contacto pessoal que o Hernâni era um gajo bué da fixe, que até se tinham
tornado amigos. Assim sendo afirmara ao Pai Flores que podia ter a certeza de
tal procedimento. E ajuntara que era uma pena não haver pena de morte em
Portugal e ele seria o próprio a dar-lhes dois tiros nos cornos!
No fim da semana descobri
que eles estavam escondidos na ilha de Santa Maria. Não posso dizer como o fiz,
mas apenas porque era um rapaz porreiro segundo me disse uma determinada
pessoa. Meti-me num avião da SATA e cheguei ao aeroporto de Santa Maria e
apenas chegado avancei para o esconderijo dos dois energúmenos onde cheguei num
táxi que tinha apanhado no aeroporto. Ficaram os dois de olhos esbugalhado e o
Onofre até teve a desfaçatez de me perguntar como é que eu os descobrira.
Dei-lhe um murro nas vendas, um directo à ponta do queixo com tal força que o
malandro caiu no chão desamparado e ficou nocaute. O cabrão do China borrou-se
pelas pernas abaixo – é a pura verdade – e
apesar da merda ajoelhou-se pedindo-me que não lhe batesse, o que eu ignorei e
dei-lhe um pontapé nas partes baixas que o arrumou a chorar.
Terminando
o caso, com o Medeiros lixado, voltei ao Pico. O Senhor Fernando Flores e a
Senhora Dona Ana agarram-se a mim e entre soluços disseram um simples obrigado.
Recebi o cheque mais do que o combinado, o que agradeci ao Senhor Flores. Um
final feliz por entre as brumas que eram os seus horizontes…
Voltei a Lisboa e ao
chegar a casa foi o habitual que nem preciso contar. Peguei na família e fomos
dar a volta que eu interrompera. De Bragança fomos ao Gerês, daí seguimos para
o Gerês Espanhol. Na Casa da Deveza comemos um churrasco de cinco estrelas e
dormimos lá por causa das bóbidas. Descemos a Miranda do Douro e por Freixo de
Espada à Cinta voltámos a Lisboa com o etc. e tal como sempre acontecia.
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Antunes Ferreira por ele mesmo: Jornalista, antigo chefe da
Redacção do Diário de Notícias (1975/1991). Rádio: TSF e outras; TV: RTP1 e
TV2. Cronista: A Bola, maior jornal desportivo; Elan, a primeira revista para
homens; Correspondente das espanholas Tiempo, Interview, Gaceta de los Negocios
e da RNE e da TVE. Política: candidato a deputado e Chefe da Redacçao do
Portugal Socialista.
Sou militante do PS, Partido Socialista, de Mário Soares.
Antes, da ASP (1969). Lutei contra a ditadura desde a campanha eleitoral do
Gen. Humberto Delgado (1958). Três vezes interrogado pela então PIDE. Etc...
Dos livros escritos, o primeiro de ficção (Abril 2008): «Morte na Picada»,
contos da guerra colonial em Angola 1966/1968. Assessor para a Informação do
ministro das Finanças, Prof. Sousa Franco, meu colega desde o Liceu até à
Faculdade de Direito. Director de Comunicação da Comissão Euro (divulgação da
nova moeda única). Dei aulas em duas universidades (privadas) em Lisboa. Gosto
muito de leccionar e... os alunos diziam que gostavam de mim... Pelo menos, até
lhes dar as notas... Imeile ou Imilio:
hantferreira@gmail.com
.
2 comentários:
Vazamigo
Vim cá enquanto o Diabo esfrega um olho e gostei. Muito. Muitíssimo. Muitérrimo!!!!
Qjs prá Maribel abçs aos filhotes e um abç com festas nas costas para tu
Henrique
Gracias, Ferreiramigo,
em breve andarei novamente por aí... beijos a Raquel.
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