30 de abril de 2010

Bendito fruto entre as mulheres

 Nos anos 60 a Escola Normal Presidente Vargas
formou seu primeiro aluno do sexo masculino
.
Ivoncléo Monteiro foi o primeiro e, por muito tempo, o único homem a ingressar na Escola Normal Presidente Vargas, em Bagé. Depois de fazer o Curso Ginasial no Estadual, Ivoncléo participou da seleção para o Normal, foi aprovado, e tornou-se o primeiro homem em Bagé a ingressar num curso, até então, frequentado apena por moças. 

Ivoncléo, oriundo de uma família de músicos, era o verdadeiro "homem dos sete instrumentos", tocava de tudo e tinha uma voz grave afinadíssima. Nas brincadeiras em sala de aula, quando as colegas cantavam o Uirapuru, do Nilo Amaro e Seus Cantores de Ébano, adivinhem quem, lá do fundo, fazia o refrão? o Ivoncléo com sua voz de tenor... 

A profissão de Normalista, que já merecera Hino, e também música, cantada por Nélson Gonçalves, sempre referindo como profissão de moças, a partir da formatura do Ivoncléo não pode mais ser vista assim. Ele abriu um precedente importante que faz com que hoje muitos outros homens também estejam trabalhando nas salas de aula do ensino fundamental. 

Nesta foto da formatura "das normalistas dos anos 60", enviada pela colega Janice, o "bendito fruto" aparece bem na primeira fila. Quem sabe o nome das "mulheres"?
.

29 de abril de 2010

Uma esquina no tempo - IV, Fiat Lux

Onde foram parar as luminárias francesas de Bagé?
;
A Dóris Schuch, leitora do nosso Blog, mas que não estudou no Estadual, nos mandou uma coleção de fotos antigas de Bagé. Entre tantas outras, selecionamos esta para publicar hoje e deixar mais um desafio aos colegas. Que rua é essa? Que esquina é essa? Certamente a imagem deste belo casarão está bem gravada na nossa memória. Não posso dizer o mesmo da espetacular luminária francesa que aparece em primeiro plano, no cruzamento das ruas, e que o Hamilton já referiu no seu texto de 16 de abril sobre a Casa A Boneca. A fotografia retrata um grupo numeroso de pessoas possivelmente acompanhando uma procissão. As irmãs da Dóris, que estudaram no Estadual, talvez saibam onde se localiza esta esquina, mas dificilmente saberão responder onde foram parar as luminárias francesas que resplandeciam luz e poesia no anoitecer de Bagé... Fiat Lux!

..

28 de abril de 2010

Dois homens, dois aeroportos

...............A queda de um avião como esse batizou o aeroporto de Bagé

"Em nossa casa, desde que eu me lembro, havia uma "atmosfera aeronáutica". Em nossa casa se respirava aviação. Éramos levados por nosos pais a olhar um avião voando ou fazendo manobras acima da casa e acompanhávamos assuntos e notícias de aviões em conversas de nossos pais com parentes e amigos. No ano de 1950 eu tive o primeiro grande impacto dos comentários e notícias sobre um acidente grave envolvendo um avião. Eu era pequeno, ainda não tinha entrado para a escola, mas já passava olhando os jornais e revistas, apontando o dedo, e fazendo a clássica pergunta “o que está escrito aqui?". Nem mesmo sonhava poder estudar em Bagé, no Auxiliadora, e o Estadual ainda estava apenas latente na cabeça de alguns líderes da cidade. Esse ambiente sombrio eu notei no dia 30 de julho de l950, quando os noticiários que nossos pais escutavam passaram esse dia, e os próximos, só falando de um trágico acidente com um avião no Rio Grande do Sul. Eu fiquei atento ao assunto e entendi o que ocorrera. As rádios, principalmente as de Porto Alegre, passaram a emitir boletins sobre a tragédia a todo momento, e tocavam "música de câmara" (esse termo nunca esqueci) nos intervalos dessas notícias. O acidente ocorrera com um avião de tamanho médio, para cerca de 14 passageiros, um Lockheed Lodestar, prefixo PP-SAA, da empresa SAVAG (Sociedade Anônima Viação Aérea Gaúcha), com sede em Rio Grande, fundada logo após a 2a guerra, aproveitando o estímulo governamental para a expansão do transporte aéreo. O piloto da aeronave, e também um dos proprietários da empresa, era o comandante Gustavo Kraemer. O voo era especial, fazia o percurso de Porto Alegre até São Borja, levando a bordo o Senador Joaquim Pedro Salgado Filho, que já havia sido ministro da recém criada Aeronáutica, desmembrada do Exército, o primeiro ministro que ocupou essa pasta. O senador agora fazia campanha para o governo do estado e se dirigia para São Borja para se encontrar com Getúlio Vargas, também do PTB, que estava em campanha para voltar a presidência da republica pelo voto direto, após o período ditatorial instituído por ele mesmo no chamado Estado Novo (1930-1945). Naqueles tempos de políticas muito agitadas, os encontros entre os próceres dos principais partidos era sempre coisa urgente. Eles não entendiam de meteorologia, e não ligavam para o mau tempo. Se havia um transporte rápido, no caso o avião, eles queriam usar à qualquer hora e em qualquer tempo, mesmo que fosse à noite e com tempestade. E os comandantes desses aviões ficavam entre a cruz do tempo e a espada dos políticos. Acabavam cedendo em voar com tempo ruim. Pois esse voo foi realizado em condições não favoráveis, tendo o piloto sido obrigado a voar baixo em muitos trechos devido às condições atmosféricas. Depois de já ter cumprido três quartos do percurso, bateu em algumas árvores no município de São Francisco de Assis, caindo em uma colina em uma fazenda de um conhecido nosso, logo após o meio dia, sob forte nevoeiro. Todos os 12 ocupantes morreram, incluindo o Comandante Kraemer e o Senador Salgado Filho. Há alguns anos visitei esse local e olhei alguns destroços. Até hoje me impressiona a qualidade do aço utilizado no trem de pouso, exposto à intempérie por décadas, que não apresentava sinais de deterioração. Foi um acidente marcante para o estado do Rio Grande do Sul e para a política de então. A eleição daquele ano foi vencida por outro petebista, Ernesto Dornelles, que assumiu como candidato no lugar do falecido senador Salgado Filho. Getúlio Vargas foi eleito mas não terminaria o mandato, suicidando-se em 24 de agosto de 1954. Em homenagem a esses importantes homens desaparecidos tragicamente no acidente, o aeroporto de Porto Alegre adotou o nome de Salgado Filho e o aeroporto internacional de Bagé passou a se chamar Comandante Gustavo Kraemer."
.
Enviado pelo colega
Hamilton Caio
.
NOTAS:
1. A empresa SAVAG acabou enfraquecida na disputa de mercado com a VARIG e a Cruzeiro do Sul e encerrou suas atividades em 1966, sendo absorvida por esta última. Por sua vez, pouco tempo depois, a Cruzeiro do Sul foi absorvida pela VARIG.
.
2. A agência da SAVAG, em Bagé, ficava na rua General Sampaio, entre a rua Sete de Setembro e o antigo Hotel Brasil, no meio da quadra. O hotel foi demolido e deu lugar ao edifício onde hoje está instalada a agência do Banco do Brasil.

.

27 de abril de 2010

15.000 pés

Nosso Blog vai partir em busca de voos mais altos do que 15.000 pés
.
Hoje o nosso Blog chegou a 15.000 "pés" de altitude. Um pouco mais alto que um voo da coqueluche. Isso, graças aos construtores, mecânicos, pilotos, aeromoças e passageiros do nosso avião, o Estadual. Estamos em altidude de cruzeiro, sobrevoando nossas recordações e procurando recuperar nossas histórias comuns. Senhores passageiros, apertem os cintos, vamos partir novamente buscando voos mais altos. O céu está claro e faz tempo bom. Obrigado por escolherem nossa "companhia" aérea.
Boa viagem!
..
Notas
1. Atingimos a marca de 15.000 acessos aproximadamente às 17h35min de hoje.
2. A foto do DC-3 da Varig, o PP VAY, que ilustra este post, está disponível em vários endereços da web.
.

26 de abril de 2010

Perigo Verde

Eu e o Perigo Verde: qual dos dois mais balaqueiro?
.
Vários guris frequentavam desde cedo o Aero Clube de Bagé. Sempre, claro, na carona de um irmão mais velho ou um outro parente que estivesse fazendo o brevet de piloto. Meu irmão era um desses alunos que buscavam a “CNH” de piloto privado, o tal brevet. Nessas idas e vindas ao Aero Clube convivi com o cheiro fortíssimo do dope usado para impermeabilizar a lona que recobria a fuselagem dos aviões, o barulho dos motores dos Pipers, Paulistinhas, Cessnas, Luscombes e um ou outro avião mais sofisticado que pousava por lá. A turma que frequentava o Aero Clube era muito boa. Todos colaboravam entre si: alunos, mecânicos, instrutores, proprietários de aviões e o pessoal da “torcida”, como eu. Foi ali no Aero Clube que voei pela primeira vez em um monomotor. Foi ali que vi pela primeira vez Bagé das alturas. Foi ali que pude entender os desenhos do Walt Disney que representavam a fazenda da Vovó Donalda com risquinhos coloridos, paralelos e perpendiculares, alternadamente. Vi as pessoas lá embaixo como formigas, vi os telhados e os pátios das casas de Bagé, os arroios, as matas, os animais correndo pelos campo assustados com o ronco dos motores. Nem ligava para o friozinho na barriga que me fazia lembrar, de vez em quando, que os meus pés não estavam mais no chão. A hora de voo contratada era cara; havia a manutenção mecânica períódica, os aviões usavam gasolina de aviação, por isso uma carona aérea era sempre bem vinda. Lembro que às vezes um pai aparecia por lá e contratava um voo recomendado pelos médicos para um filho com coqueluche. Eram voos de uma hora, em alturas em torno de três mil metros, para a criança respirar um ar mais rarefeito e “matar os germes” da doença. Essa prática, sem comprovação científica, foi abandonada mais tarde. Guri bisbilhoteiro, recém entrando no Ginásio do Estadual, aprendi muita coisa por lá. Vi motores desmontados, pistões, camisas, bielas, carcaças de velhos aviões, hélices, manches, altímetros... e lá conheci o Perigo Verde. Perigo Verde era o apelido que o pessoal mais gozador colocara no Taylorcraft verde e branco do Waldomiro Xavier Brasil, o Waldomiro XB. Chegado a fazer voos rasantes e outras acrobacias aéreas não muito recomendadas, Waldomiro, sempre muito galanteador, cuidava do seu avião com esmero. Se ter um carro balaqueiro já era bom, imaginem ser proprietário de um avião todo bossero... Um belo dia pela manhã, o PP DRN amanheceu com o tal apelido discretamente pintado na fuselagem... Waldomiro olhou, olhou, riu e gostou. Estava batizado o Perigo Verde. Foi uma festa. Suas bravuras, ou bravatas, estavam agora sacramentadas no apelido do seu avião. Waldomiro sempre tinha uma história para contar do seu Perigo Verde. Certa vez voou de Pelotas para Bagé, num fim de tarde de verão, pegando em toda a viagem o sol na linha do horizonte. Pilotou todo o tempo com uma das mãos no manche e a outra fazendo sombra para os olhos. Chegou em Bagé quase cego, mesmo usando óculos escuros. Sempre antes de aterrisar ele fazia um rasante, ainda que apenas sobre a pista. Era o jeito Waldomiro de pilotar. Não sei bem o porquê, mas numa manhã qualquer, o Perigo Verde que sempre ficava estacionado fora dos hangares do Aero Clube, incendiou durante a noite. Não sobrou nada do simpático Perigo e, ao contrário da lenda da Phoenix, ele não renasceu das cinzas. Ficou só na memória daqueles que conheceram o avião e as suas aventuras incríveis. Eu fui um desses, e até uma fotografia com ele eu tirei. Pena que não foi em cores. O Perigo Verde bem que merecia...
.
Nota: Esta postagem é dedicada ao Gerson e ao Hamilton Caio, leitores deste blog e aficcionados pela aviação.
..

25 de abril de 2010

A Revolução dos Cravos

No cano das armas portuguesas apenas Cravos Vermelhos
colocados pela população.

Hoje, 25 de abril, Portugal comemora o Dia da Liberdade, lembrando a retomada da democracia no país que havia sido suprimida do povo desde 1926 e sepultada nos tempos do Estado Novo Português de Salazar, de inspiração fascista, desde 1933. A zero hora e 29 minutos do dia 25 de abril de 1974 a música Grandola, Vila Morena, interpretada pelo cantor popular José Afonso, foi tocada em uma determinada rádio de Lisboa. Era a senha para que, praticamente todas as unidades militares portuguesas, saissem dos quartéis e tomassem conta dos pontos estratégicos do país. A população saiu às ruas e saudou festivamente os soldados com cravos vermelhos. Não foi disparado um só tiro e a alegria, suprimida do povo por 50 anos, voltou ao rostos dos nossos patrícios de além mar. Eu havia saído há pouco do Estadual e lembro bem desse dia. Uma nova constituição entrou em vigor em Portugal em 1976 e o poder voltou às mãos dos portugueses desde então. Nós esperaríamos mais uns anos para ter a mesma alegria.

.

23 de abril de 2010

Dia mundial do livro

Primeiro livro impresso no Brasil tem título enorme
e pode ser lido on line no site da Coleção Brasiliana USP

Hoje, 23 de abril, é o dia Mundial do Livro. O primeiro livro impresso no mundo foi a Bíblia de Gutemberg que começou a ser confeccionada em 23 de fevereiro de 1455. No Brasil, o primeiro livro editado, e que tem um título enorme, foi impresso em 1747 por Isidoro da Fonseca. Como publicar livros aqui era proibido, Isidoro foi preso, levado para Lisboa e sua oficina gráfica destruida. Só em 1808, com a vinda da Família Real para o Brasil, é que foi oficialmente iniciada a atividade da imprensa brasileira com a publicação de documentos oficiais e atos do Império. Um exemplar desse primeiro livro fez parte da coleção particular do bibliófilo José Mindlin. Hoje, esse livro e milhares de outras obras raras sobre o Brasil, fazem parte da coleção Brasiliana USP, por doação de Guita e José Mindlin à Universidade de São Paulo. Esses livros estão sendo digitalizados e podem ser acessados on line, por exemplo, pelos alunos do nosso Estadual. Podemos afirmar que essa coleção, de valor incalculável, foi, na verdade, doada pelo casal ao povo brasileiro, pois está disponível para leitura, consulta e pesquisa por todos os cidadãos. Vale a pela visitar a Brasiliana USP. O endereço é: http://www.brasiliana.usp.br/
O empresário José Ephim Mindlin, que comandou sua empresa, a Metal Leve, durante muitos anos, nasceu em 1914 e morreu este ano, em 28 de fevereiro. Morrer, não morreu, ele está vivo em cada página dos milhares de livros de sua Brasiliana...
.

22 de abril de 2010

Terra a vista!

Monumento em Lisboa homenageia os gajos que enfrentaram
mares desconhecidos para ampliar as fronteiras de Portugal
..
Foi num dia 22 de abril que um marujo gritou assim, bem alto, para que o comandante da frota pudesse ouvir: Terra a vista! bradou o gajo. Depois de terem partido a 9 de março, de Belém, deixando para trás, mães, filhos e noivas, os homens da equipe comandada por Pedro Álvares Cabral chegaram a uma terra, para eles, nova. Eles tinham passado muito além do Cabo Bojador, na África. Nas muitas noites que navegaram, não avistaram terra, somente a beleza do céu refletida no mar. Fernando Pessoa descreve com maestria a saga desses homens no poema Mar Português, que publicamos em homenagem a esses marujos de alma grande, e aos nossos professores do Estadual, que também nos ensinaram a passar além da dor, para que hoje ainda sintamos orgulho de ter estudado lá.
.
Mar Português
,

Ó mar salgado, quanto do teu sal
São lágrimas de Portugal?
Por te cruzarmos, quantas mães choraram,
Quantos filhos em vão rezaram!
.
Quantas noivas ficaram por casar
Para que fosses nosso, ó mar!
Valeu a pena? Tudo vale a pena
Se a alma não é pequena.
.
Quem quer passar além do Bojador
Tem que passar além da dor.
Deus ao mar o perigo e o abismo deu,
Mas nele é que espelhou o céu.
.

21 de abril de 2010

Les Chauffeurs - IX, Bispo, matrícula 382

Em 1927 Bagé já possuia um Chauffeur para o transorte coletivo
.
Mas não é que Bagé está mesmo sempre à frente? (Ou pelo menos esteve...) De acordo com documento da Intendência Municipal, datado de 11 de março de 1927, Jovenil Bispo foi declarado como "conductor de automóvel de 4 rodas" pela Inspectoria de Vehiculos de Bagé. O historiador bageense Cláudio Lemieszek garante ter sido esta a primeira licença para dirigir veículos do transporte coletivo, serviço que iniciou na cidade em 1910. O transporte urbano, segundo ele, registra que em 23 de janeiro de 1927 foi inaugurada a linha de transporte de passageiros na Avenida Sete. A linha ligava a zona do Cemitério com a chácara dos Arejanos, hoje região da AABB. O Palacete Pedro Osório, onde depois seria instalado o Estadual, marcava a metade do trajeto. A empresa Bispo & Arteche Ltda foi a responsável por esta façanha local. A reprodução do documento está no guia Alô Bagé! 200 anos. Jovenil Bispo, o Chauffeur da matrícula 382, deve ter sido o primeiro motorista da linha.
.

20 de abril de 2010

Les Chauffeurs - VIII, Ignácio: primeiro e único

Este sim, um legítimo Chauffeur!
.
Ignácio, tio avô da Maria Luiza, minha amiga e leitora do Blog, andou pelo Rio de Janeiro nos anos 30 e, impressionado com a quantidade de automóveis que viu circulando na cidade, não pensou duas vezes: tratou de tirar seu Diploma de Chauffeur na Escola dirigida pelo Engenheiro H S Pinto, e o recibo, devidamente quitado, foi passado a ele com todas as garantias dadas por este "CFC" da época. Não sei se Ignácio, ucraniano de nascimento, tinha visto tantos carros na sua terra natal como viu na Capital da República, em pleno Estado Novo. Ignácio, se tivesse sido professor do Estadual, certamente teria inaugurado a nossa série dos Chauffeurs. A Maria Luiza andou revirando os baús da casa da sua avó e achou esta verdadeira relíquia e me mandou. Os colegas lembram quando se tornaram Chauffeurs?
.

19 de abril de 2010

As afilhadas da professora Ilka

Depois de passarem pelo Ludus Primus e Secundus elas concluiram o Ginásio em 1963
.
Era a noite do dia 28 de dezembro do ano de 1963. Moças e rapazes que haviam ingressado no Ginásio em março de 1960 amontoavam-se à porta do auditório do Estadual. Era o dia da formatura. Eles já iam ser chamados para entrar e receber os seus diplomas de conclusão do Curso Ginasial. Além da platéia composta por pais, mães, irmãos, tios, avós... a mesa solene estava composta pela direção, professores e mais as chamadas autoridades civis, militares e eclesiásticas. Afinal, o dia 28 de dezembro de 1963 era dia de formatura na cidade de Bagé. Leques em movimento constante tentavam aplacar o calor das senhoras que trajavam vestido de festa e estavam perfumadas com Tabu, de Dana, ou Madeiras do Oriente, de Myrurgia. Os homens, todos de roupa completa, suavam discretamente e exalavam o perfume característico da Aqua Velva, a loção após barba da Bozzano. Não era para menos, seus filhos e filhas exigiam dos pais esse comportamento ritual após quatro anos de aplicados estudos que passavam pela química, pela física, a matemática, o francês, o inglês e até o latim dos livros Ludus Primus, Ludus Secundus, Ludus Tertius... Era a formatura do Ginásio. A professora Ilka Pêgas, de Biologia, discursaria como paraninfa da turma de moças e moços que deveriam escolher, no ano seguinte, entre o Científico, o Clássico, o Contador ou a Escola Normal... Era o futuro chegando de mansinho para aqueles moços e moças ainda com os hormônio à flor da pele... Nas escadarias do auditório uma fotografia imortalizou este momento das alunas Alaíde Ianzer, Vera Luiza, Iracema, Hella Gilda Wall... com a paraninfa, professora Ilka Pêgas, ao centro. Quem lembra o nome das outras moças? Era a noite do dia 28 de dezembro de 1963 na cidade de Bagé...
.

18 de abril de 2010

O filho da dona Laura


O filho da dona Laura, em foto inédita, cantando na Cobagelan


O ano era 1972. No tour de force que fazia Antonio Pires, governando Bagé, para obter um resultado positivo nas eleições para vereador em favor da Arena, o partido do Médici, valia tudo, inclusive trazer até nossa cidade um show do filho da dona Laura. E ele trouxe o show. E o filho da dona Laura veio. Mas onde ele cantaria? Não tínhamos ainda o Militão, o ginásio que pedimos ao presidente ao invés de uma estação de tratamento d’água, por exemplo... Era época da entresafra da lã e a solução foi montar um auditório nos depósitos da Cobagelan. E assim foi feito. O filho da dona Laura cantou e encantou a platéia bageense (e ajudou a Arena a fazer maioria na Câmara de Vereadores).

O filho da dona Laura ficou hospedado no Hotel Charrua e lá concedeu até uma entrevista gravada para o Filé, que trabalhava na Difusora. Lembro que a melhor pergunta que ele conseguiu fazer foi se “era verdade que ele e o Jerry Adriani não eram amigos”...

Milhares de pessoas foram ao show numa das muitas noites frias de Bagé, numa época que ainda fazia muito frio no inverno. Eu fui com a minha namorada, que não estudava no Estadual, e levei minha máquina fotográfica. Cantamos juntos todas as músicas e fizemos coro quando ele pediu.

Naquela época ele ainda não terminava o show jogando rosas para suas fãs. Jogou, sim, muitos beijos e autografou um violão que foi rifado em benefício de alguma entidade assistencial da cidade.

Bati muitas fotos do filho da dona Laura e jamais publiquei nenhuma delas. Até hoje todas elas eram só minhas. Hoje eu divido uma dessas fotos inéditas com os leitores do Blog em homenagem a dona Laura que faleceu ontem, dia 17, aos 96 anos. 

Um bom tempo de vida para uma lady. Uma lady chamada Laura. A Lady Laura.
.

Nota do Blog. Ao fundo aparece nossa colega do Estadual, Maria Luiza Benites Barcellos, hoje cantora nativista.

16 de abril de 2010

Uma esquina no tempo - III, Casa A Boneca

A Casa A Boneca, protegida por Hermes, testemunha incólune as mudanças da cidade
.
"E ela ainda está lá como se perguntasse: onde foi parar a Padaria Sul Brasil? Que fizeram com a Esquina Bianchetti? Quem testemunha o tempo e pergunta isso ainda hoje é a Casa A Boneca, que aparece nesta imagem de mais de sessenta anos de Bagé. Uma cidade que sempre é notada pelos visitantes devido a suas ruas largas e com árvores no canteiro central. E essa norma de adotar ruas largas e com as vias separadas por árvores centrais é uma diretriz que foi instituída, pasmem, na metade do século XIX, quando a cidade tinha apenas 40 anos de existência. O motivo invulgar: para permitir o retorno e a manobra das carretas nas esquinas, muitas delas, com até seis juntas de bois, segundo relata a historiadora pelotense Elisabeth Macedo de Fagundes, atualmente radicada em Bagé. Mal podemos acreditar que éramos nessa época a terceira cidade mais importante do estado. E não era para menos, tínhamos telefonia desde 1901 e fomos a primeira cidade do Rio Grande do Sul, e a terceira do Brasil, a ter, desde 1899, energia elétrica. Essa afirmação é do jornalista e historiador Mário Nogueira Lopes, dedicado estudioso e pesquisador da cidade. No prédio que os mais novos conheceram por Esquina Bianchetti, vemos uma casa de residência, um "solar" como era conhecido, remanescente do final do século XIX ou início do século XX, com a arquitetura característica desse período. Note-se que houve uma adaptação das aberturas do prédio antigo para se adequar ao comércio que foi posteriormente instalado ali. Compare com a foto mais recente, tomada por Ivo Barros Coelho da Esquina Banchetti no post "Uma esquina no tempo". Pelos elementos que compõem a imagem, parece ser um retrato do final dos anos 40 ou início dos 50 pois ainda não havia calçamento de pedras. Um cavaleiro ao fundo tranquilamente desce a rua, acompanhando ao lado a sua carroça, ou carreta. O palacete do Pedro Osório, futura sede do Estadual, já se destacava na quadra com o seu majestoso arvoredo. A loja de tecidos Casa A Boneca já reinava naquela quadra. Um detalhe: a escultura acima da platibanda da loja não é de "uma boneca" como a população costuma dizer, mas a imagem do deus grego Hermes, protetor do comércio, segundo artigo da historiadora Clarisse Ismério. O proprietário de então, deve ter mandado colocar ali para que o deus grego protegesse seu prédio e seus negócios. E, pelo visto, Hermes tem cuidado de sua tarefa... A rede de fios pode parecer, para os mais novos, como de rede elétrica, mas são fios da rede de telefones, com postes bem característicos do início da prestação desse serviço no Brasil. Naquele tempo a rede elétrica passava rente às casas por meio de travessas metálicas com os fios quase colados às paredes. Se apurarmos a vista, veremos essas travessas metálicas apostas no alto da parede, nos dois prédios. Em várias casas de algumas quadras de Bagé ainda aparecem uma ou outra dessas travessas metálicas, "testemunhas" do antigo sistema de distribuição de energia. O conjunto do poste central e da luminária do cruzamento, importados da França, foram retirados de todas as ruas em nome da modernidade por ordem de Antonio Pires, governando Bagé, no início dos anos 70. Lamentamos que não tenham colocado na época um “deus grego” sobre cada poste para proteger essas relíquias. Tivessem feito isso, como o dono da Casa A Boneca, os postes franceses estariam nos seus lugares até hoje fazendo inveja à maioria das cidades históricas do Brasil.
Tem horas em que a mitologia grega faz uma falta..."
.
Enviado pelo colega
Hamilton Caio
.
Nota do Blog: Foto publicada no guia "Alô, Bagé! 200 anos", editado pelo Sindilojas.
.

15 de abril de 2010

Olha o passarinho - III, "As flores de plástico não morrem"

Com um ano de diferença, as fotos do Ianzer e minha, mostram que
"as flores de plástico não morrem"
.
Atendendo ao pedido do Blog, o colega Manoel Ianzer não me deixou pagar o mico sozinho e manda para publicação no Blog a sua foto da "Lembrança Escolar" do tempo que estudou no Silveira Martins. Interessante notar que os elementos do cenário das nossas fotos são os mesmos. Os livros, o mapa, o vaso e... as mesmas flores, embora a foto dele tenha sido batida um ano depois da minha, em 1961 (veja minha foto aqui). Tony Bellotto, Sérgio Britto, Charles Gavin e Paulo Miklos, titãs autores da música Flores, dizem numa das estrofes que "As flores de plástico não morrem". Posso imaginar que as recordações escolares deles devem ter também essas mesmas flores de plástico... quem sabe não veio dai a inspiração para a música? O Ianzer, olhando a foto, também escreveu uma poesia. Os colegas do Estadual, e os leitores do Blog, estão convidados a tirar da gaveta suas lembranças escolares e procurar nelas este mesmo vaso, afinal "as flores de plástico não morrem", palavra dos Titãs...
.
A poesia enviada pelo Ianzer:
.
"UMA FOTO ANTIGA
. .
olhei aquela foto antiga
Colégio Silveira Martins
eu tinha apenas 12 anos

.
um filme veio a minha cabeça
.
foto de escola
que não se esquece jamais
aquela pose com ar de gente grande
cheio de orgulho

e juventude
porém ainda cheirando a leite
mas sem saber do destino
e das voltas que o mundo dá
.
uma camisa
e um avental branco
uma gravata azul marinho
que hoje não existem mais
um vaso com flores artificiais
não sei que fim levou

três livros na ponta da mesa
onde descobrimos o mundo
da cultura
outro aberto bem no meio
mostrando o caminho
do saber
será que ainda existem?
ao fundo um mapa gigante
da América do Sul
onde aparece o meu BRASIL
que continua firme com seus problemas crônicos

será que foi comido pelas traças?
a mesa
será que aguentou as intempéries
ou foi devorada pelos cupins?
..
os poucos colegas que ainda lembro
apenas fisionomias

.
seus nomes desapareceram
no vácuo
alguns
ficaram em Bagé
a maioria partiu atrás de seus
sonhos

eu também fui em busca
dos meus
outros
viajaram sem avisar
ou dar um - "até algum dia"
só sei que passaram por mim
como um foguete
deixando apenas fumaça
que o vento carregou
para o céu cintilante
de estrelas
.
minha primeira professora
tão carinhosa
e meiga
uma verdadeira mestra
muito nobre em seus
atos
foi um raio de luz
aquele clarão de sabedoria
que alegrou meus dias
passou tão rápido
mas deixou sua marca
de inteligência e amor
.
minha cabeça como era
e como ficou?
tinha ideias e ideais
tinha esperança e pensava
em aventura
ganhei muita coisa
muitas outras perdi
assim continuo na luta
participando desta jornada
.
a máquina da estação
nos modifica
e nos altera
a máquina da poeira
nos maltrata
e nos consome
a máquina do tempo
continua a rodar para
algum lugar
que não sabemos

.
a girar para um meio
ou fim
determinado por "ELE"

.
vivos para encarar os obstáculos
vivos para retirar os galhos secos
do caminho

.
vivos por algum motivo
muito especial

.
o importante é que continuemos vivos
para a vida eterna de DEUS."

.
Enviado pelo colega
Manoel Ianzer
.

14 de abril de 2010

Médico dos pobres, educador da juventude, amigo de todos

No busto de Carlos Kluwe, a placa com a frase que sintetiza sua vida.
Fotografia feita no pátio do Estadual pela colega Liliana Telles
.
"Quando se entra no memorial recém inaugurado pelo Esporte Clube Internacional caminha-se um espaço de memória e virtualidade, lembranças e glórias de passado e conquistas recentes."
.
Com estas palavras o nosso professor do Estadual, e depois Desembargador, José Carlos Teixeira Giorgis, inicia artigo sobre Carlos Kluwe, publicado hoje no jornal Minuano Online.  O artigo, intitulado 

Carlos Kluwe, a majestade colorada, 
continua assim:
.
"E se um bageense ali passeia encantado com as luzes e os sons, no meio de imagens e troféus encara fato que o abate de orgulho: entre as reduzidas vitrinas dedicadas a poucos atletas desponta homenagem a Carlos Kluwe, em ambiente enfeitado com o certificado da eleição como prefeito, o diploma de médico, fotos com familiares, e outros objetos doados por parentes, tudo organizado com devoção pela jovem pesquisadora conterrânea Júlia Preto de Vasconcelos. Ali se ostenta, ainda, uma placa de reverência (1968): - “Médico dos pobres, educador da juventude, amigo de todos“, frase que resume existência invulgar. Carlos Antonio Kluwe nasceu em Bagé em 3 de janeiro de 1890; depois dos estudos preliminares foi para Porto Alegre, destinado ao curso médico, mas também ao Internacional, recém fundado pelos irmãos Poppe: estreou em 7 de setembro de 1909, empate sem golos contra o Militar Futebol Clube. Segundo os cronistas era conhecido como a majestade dos gramados: alto, um metro e noventa de estatura, apolíneo, seu chute potente, de qualquer distância e sem pé de preferência, era cantado por todos. Narram que moldou o time com a marca de sua forte personalidade, tornando-se responsável pelas vitórias conquistadas nos campeonatos de 1913, 1914 e 1915; abandonou o esporte em 1915, aos 26 anos, quando se graduou na Faculdade de Medicina da Universidade Federal, embora também tenha sido diretor, e até treinador, em época posterior. Compôs em equipe invicta: Russomano; Ari e Simão; Barbieri, Carlos Kluwe e Tom; Túlio, Flores, Bendionda, Átila e Barão; sua frustração, dizia-se, era não haver vencido um clássico, pois o Grêmio abandonara a Liga e disputava certame apartado (1914/15). Em julho de 1919, quando médico, como fizesse grande sucesso entre as mulheres por sua beleza física, atendeu a um “abaixo-assinado” das moças coloradas para voltar aos gramados e jogar um Gre-Nal, agendado para a Chácara dos Eucaliptos. Não deu outra: embora afastado por quatro anos, Kluwe retornou e fez um dos golos da vitória por dois a zero sobre o rival, atuando o resto da temporada; em 1920 sagrou-se campeão outra vez, e largou o futebol. O resto se sabe: o doutor Kluwe regressou a Bagé, dedicando-se ao sacerdócio em que se tornou profissional humanitário amado pela população; foi exator das rendas estaduais e prefeito (1948/1951); como profeta da educação adquiriu o palacete Osório para o município e o emprestou para instalar-se o Colégio Estadual (1955), seu derradeiro afeto e adotou seu honrado nome. Visitava o educandário quase todas as noites, circulando pelos corredores, conversando com os professores; depois de almoçar obedecia ao compromisso cotidiano de disputar xadrez com Floriano Rosa, Zezo Antunes e outros amigos, na biblioteca do Clube Comercial. Faleceu em 16 de setembro de 1966; lá na ponta da praça seu busto fiscaliza o estabelecimento que projetou, sempre fábrica e matriz de gerações bem sucedidas. Os historiadores concordam: Carlos Kluwe foi o primeiro ídolo colorado."
.

13 de abril de 2010

Olha o passarinho! - II, A caixa de sapatos da vovó

Conforme prometi, em resposta a um comentário da Léli na postagem do dia 8 de março, Olha o passarinho!, estou publicando um artigo que escrevi ainda quando era aluno do Mestrado em Memória Social e Patrimônio Cultural, do ICH/UFPel, e que foi publicado em março de 2009 no Jornal Amanhã, de Jaguarão. Ele faz parte de uma série que denominei de "A década sem memória", em virtude do risco que corremos de ficar sem registros de imagens para o futuro deste tempo que tem o predomínio da fotografia digital. As fotos do nosso tempo do Estadual que têm ilustrado as matérias do Blog, tenho certeza que permanecerão nas "caixas das vovós" por muitos anos ainda. As fotos digitais que tomamos hoje... não sei não se ainda as teremos no ano que vem!
 .
 .
 Em 12 de dezembro de 1942, o soldado ainda noivo,
pensa na convocação da FEB e na noiva que deixaria em Hulha Negra...
(foto da "caixa de sapatos" da Vovó Loracy)
A Caixa de sapatos da vovó
Luiz Carlos Vaz (*)
. .
"Nunca se fotografou tanto. Nunca tantos tiveram tantas máquinas. Nunca foi tão fácil e barato fotografar. Nunca corremos um risco tão grande de perder a memória. Dizer tudo isso parece uma contradição. Mas não é. A mesma modernidade que nos trouxe a popularização da fotografia, como queriam seus criadores, um século atrás, também colocou uma dose de vulgarização no ato de fotografar. Chega a ser irritante, quando em qualquer lugar público, num momento solene, saltam dezenas de máquinas digitais, telefones celulares e outros equipamentos, ditos também “fotográficos” e, numa sequência de zunidos e cliques de toda a ordem, o silêncio obsequioso da hora é quebrado pela movimentação de uma parafernália indescritível de equipamentos que servem “para fixar a imagem”. Correto, fixar a imagem. Mas por quanto tempo? Em que tipo de suporte? Nesse momento é que nossa memória começa a correr o risco de desaparecer. Os suportes digitais preservam as imagens enquanto alguma coisa mais interessante e atual não exigir a limpeza do HD ou do chip onde estava guardada uma imagem, dita importante, feita há algum tempo atrás. Não se tem mais o costume de copiar, ou modernamente, imprimir as fotografias. As velhas caixas de sapatos, com os retratos do tempo da vovó, é que continuarão a ser por muito tempo a referência de nossas lembranças fotográficas. As fotografias coloridas dos anos 70 já perderam a cor e, quem sabe, boa parte das informações. Quando, nos anos 80/90, o processo ganhou legitimidade e definição fotoquímica “saiu de moda”. As fotos digitais tomaram conta do mercado – e o mercado somos nós – e abandonamos as máquinas fotográficas convencionais e os processos químicos de revelação em papel. Dependemos agora de um complicado código de “zeros” e “uns” que guardarão (?) as imagens de hoje desde que respeitadas as condições apropriadas para conservação dessa nova mídia. A verdade é que ainda temos em casa “slides kodak” mas não temos mais projetor e lâmpada. Temos fitas VHS e não temos mais um videocassete com cabeçote sem mofo. Hoje temos os HDs, as câmeras digitais, os celulares com seus chips... e onde estão nossas fotografias? Somente nas memórias deles ou já copiamos em papel? Mas, vejamos bem, quantas centenas de fotografias já tomamos com nossas digitais? Vamos imprimir todas elas? Com certeza não! A caixa de sapatos da vovó, que guarda retratos quase centenários, é que continua sendo o único lugar seguro onde, com certeza, nossa memória visual ficará, ainda por muitos anos, preservada. Cuide da sua caixa! Vovó, e nossa memória, vão ficar agradecidas."
..
Março de 2009.
...
(*) Jornalista, fotógrafo e mestrando em Memória Social e Patrimônio Cultural do ICH/UFPel
.
Artigo publicado no jornal Amanhã, de Jaguarão, dia 18 de março de 2009, na coluna Patrimônio cultural, cidade e memória, de Alan Dutra de Melo.
.
.

12 de abril de 2010

Uma esquina no tempo - II, Nem só de pão...

A Continental, com seu nome em letras góticas,
é uma das mais antigas padarias de Bagé

Neste prédio funcionou a Escola Rotária Dr Penna

Nem só de pão...

Hamilton Caio

"Quero falar de uma lembrança de pão. Da lembrança de uma padaria tradicional que já desapareceu. A Padaria Lamas. Uma padaria tão antiga e conhecida como a Padaria Continental. Quando nossa família voltou para Bagé em março de 1953, eu já estava pensando que seria aluno do Colégio Auxiliadora e lembro até do uniforme, pois tínhamos um vizinho que era aluno interno de lá. 

O Estadual ainda não existia. Vínhamos da Hulha Negra das "marias sentadas", onde a família passou a maior parte da minha infância, e fomos morar na rua General Sampaio, número 498, que era no lado oeste. Hoje essa rua se chama Monsenhor Costábile Hipólito. Eu era encarregado de comprar o pão pela manhã bem cedo, antes da aula. Vem daí a primeira lembrança do pão chinelo, grande, que eu apanhava na Padaria Lamas, que ficava na rua Barão do Triunfo, entre as quadras da Sampaio e General Neto. Depois ela andou por outros locais, ao que parece. 

O prédio ainda existe, posteriormente ali já funcionou um supermercado. As imagens que ficaram na minha lembrança: o trajeto até a padaria, descendo pela rua Sampaio, passando pela ponte (hoje com o arroio canalizado) próximo onde está a Auditoria Militar, e a subida da próxima quadra, onde eu ficava intrigado porque a rua tinha duas mãos, com canteiro central, e os carros só subiam pela rua (mão) da direita. Eu me perguntava: Por que será que eles não sobem pela outra rua também, de vez em quando? Depois vinha a passagem pelo lado da Uzina Elétrica, onde hoje é a sede da CEEE, com aquele ruído forte bem característico, e contínuo, dia e noite, de motores, geradores e radiadores funcionando. Não sei como os moradores daquelas quadras em frente aguentavam. Esse ruído eu tenho gravado até hoje na memória. Da nossa casa ainda era possível ouvir, embora mais fraco, principalmente com o silêncio da noite. 

Na próxima quadra à padaria, uma imagem indelével daquele interior... o ar quente, levemente úmido e enfumaçado (ou seria enfarinhado?) da fabricação dos pães, e massas também, em contraste com o ar frio da manhã, e o ruído dos aparatos e das máquinas trabalhando. Eu via as massas estendidas em suportes verticais e várias funcionárias manuseando-as. Aí eu apanhava os "chinelos", e na volta, o preparo para a aula. 

Eu estudava em um colégio chamado "Escola Rotária Dr Penna", há umas três quadras de casa, na rua Dr Penna. As professoras eram a Heloisa Bellaguarda, a minha do segundo ano primário e a Ildara Barros Coelho (a nossa conhecida de outro post), a professora da minha irmã, Maria Gleide, no primeiro ano primário. A fisionomia e a voz delas, claro, tenho gravadas na memória. 

Mas o fato marcante é que o pão "chinelo" ficou sempre associado a essa ida diária na Padaria Lamas. Uma curiosidade: por muitas décadas ainda a população, principalmente os mais velhos, continuou a chamar a CEEE de "uzina", quando se referiam a qualquer problema com a luz. Era um "ir na uzina", um "vou na uzina reclamar" ou "chama a uzina", mas a CEEE já estava ali há muito anos. Enfim, esse tempo - que já vai longe, nos traz à memória muitas coisas pois nem só (de lembranças) de pão viverá o homem..."
.
Enviado pelo colega
Hamilton Caio
.
.

10 de abril de 2010

Uma esquina no tempo

Uma esquina para marcar nossa memória
.
Se há uma esquina no tempo para os alunos do Estadual, essa é a esquina da Padaria Sul-Brasil, ou, para os mais novos, a Esquina Bianchetti. Ali, o cheiro de pão quentinho era um verdadeiro perfume de Madame Chanel. A hora do recreio era a oportunidade para saborearmos os dentinhos, as bicicletas e, nos períodos quentes, os sorvetes e picolés que gelavam a garganta. Mas o sabor dos biscoitinhos, da Padaria Sul-Brasil ou Esquina Bianchetti, como queiram, é, efetivamente, o que mais marcou a memória de todos. Acho que pode ter mudado a razão social mas permaneceu o mesmo padeiro. Segundo o colega Sérgio, a Esquina Bianchetti não fechou. Mudou de endereço. Várias vezes, segundo diz. Foi para a Barão do Triunfo, em frente ao XV, depois para a Juvêncio Lemos, depois voltou para a Barão, em frente aos Bombeiros. A última localização teria sido na Conde de Porto Alegre, perto da Catedral. Mas é uma informação de 2006, hoje?... não sabemos. Numa fotografia tomada pelo fotógrafo Ivo Barros Coelho, publicada pelo Ézio no Suplemento Underground, aparace o belíssimo prédio onde eram fabricados os biscoitos mágicos que marcaram de forma tão profunda o paladar e as lembranças de todos os alunos do Estadual.
.

9 de abril de 2010

Vai parar na esquina - II, Desce uma bicicleta!

A foto de Francisco Bosco, na Zero Hora, mostra a novidade
.
O Jornal Zero Hora de hoje publica uma matéria sobre uma novidade em Bagé. A possibilidade de fazer um percurso pela cidade, parte de ônibus, parte de bicicleta. É, é isso mesmo. No tempo do Estadual os alunos não costumavam nem andar de ônibus... mas nossa cidade está sempre lançando moda. Vejam a notícia completa clicando AQUI.
.

8 de abril de 2010

Olha o passarinho!

Minha mãe diz que eu era o mais bonito da turma...

Não lembro de ter visto nada voando e nem pousado. Mas lembro exatamemte da frase do homem que usava terno escuro e se postava atrás de uma máquina fotográfica de fole: "Olha o passarinho!" Eu não estava nada confortável naquela cadeira pois tive que sentar sobre três ou quatro volumes de uma enciclopédia qualquer para que ficasse com o peito à altura da mesa. Eu queria mesmo era ficar olhando para aquele vaso em forma de bota que me chamava mais a atenção do que o passarinho imaginário que o homem insistia para que eu olhasse: "Olha o passarinho, menino!" Bem, não digam que eu não tentei. Imaginei o tal passarinho pousada na careca do homem e até sorri. "Pronto! O próximo", disse ele para a professora Serany dos Santos Leite, que era a professora do segundo ano primário. A fotografia, colorizada com anilinas, custava caro e demorava para ser entregue. Mas no dia que isso aconteceu fui correndo para casa levando aquele pequeno cartão com minha fotografia colada nele. Era a Lembrança Escolar do segundo ano primário da Escola Municipal Dr. Cândido Bastos. Era a primeira da minha vida. Eu ainda nem imaginava que um dia pudesse ser aluno do Estadual. Hoje, olhando para ela, ainda lembro do passarinho imaginário disputando minha atenção com o vaso em forma de bota e de estar sentado sobre três ou quatro volumes de uma enciclopédia qualquer que causavam um desconforto tal que não havia passarinho que me fizesse ficar concentrado. Minha mãe até hoje afirma que eu era o mais bonitinho da turma. Bem, as mães sempre tem razão, fazer o quê?
.
Nota do Blog: Não me deixem pagar esse mico sozinho. Mandem também as suas Recordações ou Lembranças Escolares para publicação. Garanto que as mães de vocês também achavam a mesma coisa que a minha...
..

7 de abril de 2010

Mostra fotográfica 200 anos

Comissão trabalha na seleção das fotografias que comporão a Mostra
.
A Colega Heloisa Beckman envia nota sobre a Exposição Fotográfica que abrirá as comemorações dos 200 anos de Bagé. Certamente alguma foto retratará algum aspecto do nosso Estadual.
.
"A Comissão de Seleção das fotografias para a exposição "Dois Séculos do Cotidiano de Bagé – Imagem, Poesia e História", reuniu-se no Museu Dom Diogo de Souza e, diante da diversidade e beleza das imagens enviadas, resolveu optar por fotografias que contemplem pessoas reunidas em Grupos, e que tenham como referência o distanciamento histórico, para que a mostra seja elaborada através da linha do tempo. À tarde, em reunião do Núcleo de Pesquisa Tarcísio Taborda, na Casa de Cultura, a Comissão falou de suas escolhas e então foi sugerido que esta seja a primeira exposição, de muitas, organizadas pelo Núcleo, e que como a Comissão neste ano deu preferência a Grupos, a próxima Mostra contemple Retratos, como muitos preparados em estúdios, em poses clássicas. Depois, seria a vez das Crianças. Posteriormente, fotos de Casamentos, Batizados, Primeira Comunhão, entre outras sugestões. Diante dessa decisão, aprovada por todos, a Comissão estenderá até o final do mês de Abril o prazo de entrega de fotografias que mostrem pessoas reunidas, grupos em atos festivos, cenas familiares, cenas públicas, inaugurações, registros feitos em estúdios, etc. Também foi decidido que essa Mostra será feita através de grandes painéis, onde fotografias e poesias serão impressas com requintada elaboração gráfica para que, depois do período de inauguração (previsto para o dia 13 de julho, integrando as festividades da Semana de Bagé) e já na contagem regressiva para os 200 Anos, a Mostra seja levada à Instituições Públicas e Privadas, Universidades, Escolas, etc e que levará o nome de Dois Séculos do Cotidiano de Bagé l – Imagem, Poesia e História."
.
Enviado pela colega
Heloisa Beckman
..

6 de abril de 2010

O travesseiro do Hotel Quitandinha

Bar Hotel Quitandinha, o "templo" do famoso travesseiro
.

Quando a opção pelo trem já não era mais possível, a viagem entre Bagé e Pelotas passou a ser feita exclusivamente pelos ônibus do Expresso Princesa do Sul. Não havia as beerres asfaltadas e o trajeto era todo por estradas de chão batido. Asfalto, os alunos do Estadual só conheciam o da Carreteira, em direção ao aeroporto Comandante Kraemer, que nos levava até a fronteira com o Uruguai.

A viagem até Pelotas durava seis horas em média. Dependia de quantos pneus furassem durante o trajeto. Dependia dos desvios que o motorista necessitasse fazer em caso de chuvas fortes. Dependia se o parabrisa do ônibus quebrasse ou não. Dependia de muitos fatores. Por isso a parada em Pinheiro Machado, no Quitandinha, era fundamental.

O pastel servido ali, parecido com um travesseiro, fornecia energia suficiente para enfrentar mais duas, três ou quatro horas de viagem. Tanto na ida como na volta. O pastel era uma pedida obrigatória. O pastel parecido com um travesseiro. O pastel do Quitandinha só podia ser saboreado por nós, em Pinheiro Machado, numa viagem entre Bagé e Pelotas. Por isso, antes de embarcar no ônibus, era preciso conferir se havia no bolso uns três ou quatro cruzeiros, separadinhos, para o pastel travesseiro.

Entrar no Quitandinha e pedir um pastel e um café preto, passado no saco de pano, era se colocar às portas do paraíso. Ai não interessava mais quantos pneus furassem, quantas paradas o ônibus fizesse para apeiar ou trepar mais alguns passageiros no clássico sistema da viagem pinga-pinga... o estômago estava forrado pelo travesseiro, estava farto até a próxima refeição ou a próxima viagem.

O pastel do Quitandinha deveria ser tombado pela Unesco. Não é só um pastel, é um Patrimônio da Humanidade.
.

5 de abril de 2010

As marcelas do Cerro - III, Ilex paraguariensis

A Danielle Ianzer prova um mate numa cuia "maior do que ela"


Numa visita a Bagé, em 1983, o Manoel Ianzer, nosso colega do Estadual, levou a família para visitar a Festa Crioula. Na oportunidade, sua filha Danielle, pode provar o tradicional mate gaúcho no Parque de Exposições Visconde Ribeiro de Magalhães. Pela expressão da Danielle parece que ela gostou... Hoje ela é uma cientista que trabalha com pesquisa ligada à área de hipertensão. Ela, certamente, pode comprovar os efeitos benéficos para o coração da tradicional bebida de origem indígena...
.

4 de abril de 2010

As marcelas do Cerro - II, a "Colheita feliz"

Quase dá para sentir o pefume das marcelas colhidas pela Janice

Pois tai a Janice com as suas marcelas para todo 2010... Como faz todos os anos, a nossa colega do Estadual foi colher as suas marcelas na sexta-feira santa, mas "bem longe das estradas devido à contaminação por metais pesados proveniente do cano de descarga dos automóveis", disse ela. Sábia a Janice. Infelizmente muitas pessoas não atentam para isso e acabam levando para casa ervas de chá contaminadas. Bem, pela quantidade que a Janice colheu, acho que vai dar para todos nós da "velha guarda do Estadual..."
.

1 de abril de 2010

Nisan, 13, quinta-feira

A última ceia, Carlo Andrey, Bagé RS

Foi num dia 13 de Nisan, uma quinta-feira como a de hoje, que o cara reuniu a turma de amigos mais chegados para uma jantinha. Só que o que seria apenas um vinho e um pãozinho italiano para animar um papo mais ameno, transformou-se numa conversa mais profunda. Não é que o cara falou coisas difíceis de entender e até disse que havia um dedo-duro ali entre eles? Todo mundo ficou se condenando, sem entender muito, mas nenhum deles pensou em alguém em particular. Pô, trair o cara era demais! Eles andavam sempre juntos, tinham deixado inclusive os afazeres de lado para andar, ouvir e aprender com ele. Mas a reunião dos amigos foi indo noite adentro e acabou sendo o última com todos juntos. E, olhem só, no outro dia aconteceu tudo como a cara falou. Teve gente traindo, gente negando a amizade e até galo cantando para lembrar as palavras dele. Os acontecimentos desse jantar ficaram tão famosos que vários artistas, ao longo do tempo, procuraram imaginar e retratar a cena. O Carlo Andrey, um dos grandes artistas bageenses da atualidade, e que foi aluno do Estadual, também imaginou como terá sido esse último encontro dele com os seus amigos. E o pessoal da época foi tão sacana que acabaram pregando o cara numa cruz só com base em acusações falsas. Dá para imaginar uma coisa dessas?
Ele só tinha 33 anos, 4 meses e 13 dias de idade...
.....