Quando a opção pelo trem já não era
mais possível, a viagem entre Bagé e Pelotas passou a ser feita exclusivamente
pelos ônibus do Expresso Princesa do Sul. Não havia as beerres asfaltadas e o
trajeto era todo por estradas de chão batido. Asfalto, os alunos do Estadual só
conheciam o da Carreteira, em direção ao aeroporto Comandante Kraemer, que nos levava até a
fronteira com o Uruguai.
A viagem até Pelotas durava seis
horas em média. Dependia de quantos pneus furassem durante o trajeto. Dependia
dos desvios que o motorista necessitasse fazer em caso de chuvas fortes.
Dependia se o parabrisa do ônibus quebrasse ou não. Dependia de muitos fatores.
Por isso a parada em Pinheiro Machado, no Quitandinha, era fundamental.
O pastel servido ali, parecido com
um travesseiro, fornecia energia suficiente para enfrentar mais duas, três ou
quatro horas de viagem. Tanto na ida como na volta. O pastel era uma pedida
obrigatória. O pastel parecido com um travesseiro. O pastel do Quitandinha só
podia ser saboreado por nós, em Pinheiro Machado, numa viagem entre Bagé e
Pelotas. Por isso, antes de embarcar no ônibus, era preciso conferir se havia
no bolso uns três ou quatro cruzeiros, separadinhos, para o pastel travesseiro.
Entrar no Quitandinha e pedir um
pastel e um café preto, passado no saco de pano, era se colocar às portas do
paraíso. Ai não interessava mais quantos pneus furassem, quantas paradas o
ônibus fizesse para apeiar ou trepar mais alguns passageiros no clássico
sistema da viagem pinga-pinga... o estômago estava forrado pelo travesseiro,
estava farto até a próxima refeição ou a próxima viagem.
O pastel do Quitandinha deveria ser
tombado pela Unesco. Não é só um pastel, é um Patrimônio da Humanidade.
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10 comentários:
Era muito fatigante para os que precisassem fazer esse trajeto diariamente, como professores, alunos, funcionários ... Faz lembrar outro local semelhante na "jornada" Bagé-Porto Alegre, um restaurante em Lavras do Sul (qual era o nome ?), era outra marca de "travesseiro". Tempos heróicos ! Mas já houve época ainda pior, ou mais heróica, quando esses percursos eram feitos em DILIGÊNCIAS, sim, diligências, naquele bom estilo dos filmes western, com postos ao longo da estrada para troca de cavalos. Isso só começou a mudar com o primeiro alvorecer da ferrovia aqui em Bagé, dia 2 de dezembro de 1884. Mas, a história do desmonte do transporte ferroviário, em favor do uso intensivo das rodovias, na contramão da tendência mundial, ainda falta ser bem contada.
Bah! o Hamilton agora foi longe! Bem, vamos esperar que ele pesquise e nos conte as histórias do tempo das diligências. Eu só conheci, ainda nos anos oitenta, as diligências de Rio Branco, na fronteira com Jaguarão, que faziam a linha até a Cuchilla. Eram exatamente como as que o Hamilton fala. Era uma imagem parada no tempo...
A narrativa do Vaz nos transporta para o interior dos ônibus daquela época. Chegamos a sentir o ambiente empoeirado do verão, ou úmido, com janelas embaçadas, cheirando a cigarro, pela janelas fechadas no inverno. Ar condicionado era imaginação do futuro. Chegava a dar náuseas, e ainda tínhamos que aturar alguns colegas falando de aulas e professores, e outros que haviam passado o fim de semana bem desligados, em véspera de prova, tentando recuperar o tempo perdido, estudando a matéria em voz alta ! Nem o travesseiro do Quitandinha compensava essa aventura. Pensando bem, acho que viajar de diligência era melhor !
O Hamilton lembra um aspecto interessante dessa época. Era possível - e aceitável, que se fumasse dentro dos ônibus. Apenas era proibido "charutos e cigarros de palha". E os homens, principalmente, usavam e abusavam dessa permissão, infernizando a vida de grávidas, crianças, asmáticos...
Precisamente lembrado, era uma proibição parcial do tabaco. De nada adiantava, as consequências eram as mesmas. É importante dizer que o estado do Rio Grande do Sul foi pioneiro na proibição do fumo nos ônibus, começando aqui pelas linhas intermunicipais, as que estavam sob jurisdição do governo estadual. A partir daí, essa medida sanitária contagiou o restante do país. Também, convém relembrar que o estado foi pioneiro em impor medidas contra a poluição de fábricas de celulose, obrigando a empresa Borregaard, norueguesa, a tomar prividências para esse controle.
Até vou dar uma olhada nos "adesivos" que ainda existem fixados nas janelas dos ônibus. Além da inscrição "Proibido fumar cigarros ou assemelhados" parece que há o número e o ano da lei. A propósito: no centenário Mercado Público de Porto Alegre mantiveram, mesmo depois da reforma, placas em louça águeda, fixadas nas paredes, com a inscrição "É prohibido escarrar no chão!" Fumar devia poder...
É, lendo vocês me obrigo a retrocedr no tempo e rever a minha velha casa. Pois o ônibus que passava no "Quitandinha" antes passava bem em frente ao velho casarão, na vila de Seival. Onde me crei, e onde iniciei o estudo primário.
Parece-me chamave-se Princesa do Sul a empresa gloriosa que fazia a linha Bagé-Pelotas.
Sim Pedro, era essa a empresa. Em Bagé a garagem ficava perto da cadeia. Ainda existe o casarão onde moraste no Seival? Vamos tirar uma foto dele...
Sim, creio que sim, era uma construção muito sólida. Não o vejo a décadas. Passaram à outras mãos.
Procura no Google Earth e me manda uma dica da localização.
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