24 de junho de 2010

A taça do mundo é nossa! - X, A Copa sem Pelé

O Chile, reerguido de Valdívia, organizou a copa do nosso bi...

...onde era cobrada de Pelé uma atuação digna de Rei.

Foi no Chile, em 1962, que a Copa do Mundo começou a ganhar a mídia de televisão. A Europa só não pode vê-la, ao vivo e em preto e branco, pois o satélite de comunicações Telstar foi lançado um pouco depois. No entanto, no Brasil as fitas com os “vídeo-tapes” eram mandadas pelos aviões da - Varig Varig Varig, e a TV passava os jogos já no dia seguinte. Na Europa isso acontecia dois dias depois. As transmissões pelo rádio comandavam o espetáculo mas tudo podia ser conferido logo em seguida na televisão. Uma grande novidade. Os ingressos, todos apresentando os preços em dólares, na final foram vendidos por dois valores: U$ 2,20 e U$ 5,00. A frase que resumia a realização da competição no Chile, ainda sofrendo os efeitos do terremoto de Valdívia, em 1960, foi pronunciada num discurso, pós catástrofe, pelo brasileiro, naturalizado chileno, e presidente da Confederação Chilena de Futebol, Carlos Dittborn: “Porque nada tenemos, lo haremos todo!” Essa frase teria convencido a Fifa da capacidade dos chilenos de, reerguidos do sismo, realizar a Copa sem problema algum. O Brasil, campeão em 58, era uma euforia só. Várias emissoras de rádio, patrocinadas por inúmeras marcas comerciais, lançaram dezenas de concursos com o mote: “Quantos gols Pelé marcará na Copa de 1962 ?”. Depois de nascer Pelé, em 1958, o não mais garoto Édison, era a nossa maior estrela. A imprensa cobrava muito, o Santos Futebol Clube cobrava muito e os torcedores cobravam mais ainda. No dia marcado, 30 de maio de 1962, em vários estádios ao mesmo tempo, começou a copa do Chile, a Copa da consagração do recém iniciado reinado de Pelé, o Rei do Futebol. E nesse dia já ganhamos do México por 2x0, com um magnífico gol de Pelé. O que ninguém esperava, entretanto, é que na segunda partida da primeira fase, jogando contra a Tchecoslováquia, com uma regra que não permitia banco, portanto, sem substituições, o nosso Rei sofresse uma contusão na coxa e ficasse de fora da copa da sua consagração. Ele tentou permanecer no jogo, mesmo contundido, auxiliando os colegas no posicionamento em campo que, diante de tamanho desastre, só conseguiram manter um digno empate em 0x0. “É incrível, torcida brasileira, o Rei do Futebol, o Rei Pelé, está sendo retirado de campo, mancando” - dizia com a voz embargada o locutor da Rádio Guaíba. E nós, que só falávamos no Estadual que esse era a copa Dele, ficamos mudos, ouvindo a narração emocionada do locutor informando que a nossa esperança do bi, saía, se arrastando numa perna só, do estádio Sausalito em Viña Del Mar. O café com Bolachas Vênus, que a mãe servia para nós naquele fim de tarde, daquele triste dois de junho, foi ganhando um gosto salgado pois as lágrimas que escorriam do rosto misturavam-se ao leite na xícara azul de louça águeda... Era o fim do sonho. O Rei estava "morto". Não havia herdeiro pra aquele trono.

Mas ai chamaram o príncipe, o Amarildo, com a enorme tarefa de substituir o Rei lesionado... E ele o fez. De cara, no terceiro jogo da nossa seleção, o primeiro sem Pelé, Amarildo fez os dois gols na vitória apertada contra a Espanha, por 2x1. Estávamos na segunda fase! Ainda que sem Pelé. Na partida das quartas de final, Brasil x Inglaterra, um cãozinho entrou em campo e driblou até o craque das pernas tortas, o Garrincha. Foi um jogador do English Team, Jimmy Graves, que "hipnotizou" o cão e, ficando “de quatro” no gramado, segurou firme o animalzinho tirando-o de campo. Que presságio!!! Vamos perder!!! Que nada, ganhamos dos ingleses de 3x1. E fomos avançando. Sem Pelé. No dia 13 enfrentamos a seleção "dona da casa". Fizemos 4x2 sem maiores cerimônias. E esse escore nos levou à final com a.... Tchecoslováquia, de novo! Não! Mas ai eram 11 contra 11. Sem Pelé, ganhamos com Amarildo, com Garricha, Vavá, Didi, Nilton Santos...

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Carlos Dittborn, não viu a copa que organizou, teve um infarto e morreu um mês antes do início. Como disse: “por não termos nada, vamos fazer tudo”. E ele levou ao pé da letra sua frase. Deu a sua vida para que saísse a Copa do Chile. O estádio de Arica recebeu seu nome ainda antes de iniciar a Copa de 1962, a Copa em que ganhamos o bi, a Copa onde Pelé, para desespero de todos os apostadores, fez apenas UM gol.


Fonte Fifa, Arquivo Público Municipal de Bagé e arquivo de jornais.


(continua)


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Um comentário:

Hamilton Caio disse...

Assuntos abordados no texto e que eu sempre lembro:

- O Telstar, a primeira estação de comunicações colocada na órbita da terra, possibilitou as primeiras transmissões comerciais de televisão, a longa distância.

- "Vídeo-tape", o nome que foi usado nas primeiras gravações de imagem/som em fita magnética. Depois foi abreviado, na prátrica, para "tape". Hoje se conhece como "vídeo". O tempo e a população vão construindo, adaptando e simplificando o vocabulário ...
Eu conheci amigos, não vou dizer os nomes, que ficavam assistindo os "tapes" de grenais, à noite depois dos jogos, e ainda "torciam" naquelas jogadas "quase entrando a bola", na esperança que ela ainda penetrasse na goleira do adversário, rsrsrs !

- Varig, varig, v a r i g - O jingle que ficou marcante e identificava as propagandas daquela que foi a maior empresa aérea da América do Sul.

- Os terremotos cíclicos na região dos Andes, que devido a proximidade de uma falha geológica são mais violentos.

- A Copa que ficou marcada pela contusão de Pelé.

- A Copa em que as transmissões pelo rádio ainda foram as grandes vedetes nas comunicações.

- A cidade de Viña Del Mar e seu estádio de Sausalito que ficaram associados à seleção brasileira.

- O fenômeno Amarildo que entrou e salvou a equipe brasileira.

- As imagens que ficaram bem conhecidas do jogador inglês que conseguiu apanhar o cão invasor do campo.

- E a surpresa, e até irritação da torcida, de ter que enfrentar, de novo, a seleção da Tchecoslováquia.