19 de fevereiro de 2012

A poesia necessária - XVII, Diário da guerrilha

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diário da guerrilha
ângelo alfonsin
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primeiro os cães
e os gatos 

depois o pai e a mãe

aos poucos os poucos

raros
amigos
e mais cedo ainda os sonhos

se vão para sempre 

como se tudo jamais tivesse 

existido a não ser em sonho

o que restou de mim 

não ocupa o vazio

da cadeira vazia

as mesas nunca mais vestiram

toalhas de festa 

as flores mudaram-se 

para o jardim das formigas

as frutas perderam 

o gosto da inocência

com as mordidas insípidas

da vida adulta

dias cinzas

noites em claro
 
atrás de vogais gagás

consoantes que não soam

os poemas viram pó

atrás de mundos 

que não existem mais

as tardes já vão tarde

os sofás fazem sala

para as paredes

na mesa do café a xícara

transborda de silêncio

fumegante

as reminiscências

arrastam correntes

pelos porões da memória

a lua cheia enche a noite

de lua 

o sol quando abre a janela

traz uma fatia do dia

com cheiro de novo

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fotografia marcelo soares
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2 comentários:

Anônimo disse...

Encontraste meu "diário da guerrilha" da vida, na minha ilusória "La Higuera", pelas quebradas do rio Yuro.
Como diz o hino: uma vez Vaz, sempre Vaz.

abraço

Luiz Carlos Vaz disse...

“Na quebrada do Yuro
eram 13,30 horas
(em São Paulo
era mais tarde; em Paris anoitecera;
na Ásia o sono era seda)
Na quebrada do rio Yuro
a claridade da hora
mostrava seu fundo escuro...
.
(este sim Ângelo, um verdadeiro Hino! Um abraço!