30 de julho de 2021

Náufrago de uma Paisagem Marinha

 

                                                    Foto, Luiz Carlos Vaz


Luiz Carlos Vaz (*)

 

Comecei a ler Paisagem Marinha, o mais novo livro do Vitor Biasoli.

Parei.

Não deu para continuar!

Não foi possível continuar a leitura como se eu tivesse em minhas mãos apenas mais um livro de poemas.

Parei. Fui respirar um pouco, buscar concentração... Eu não tinha recebido pelo correio, depois de tanto tempo, de tantas des-entregas, e tantas peripécias do nosso bravo Correio, maisumlivrodepoemas! Tinha, sim, uma lâmina afiada, que rasga a pele, abre a carne, e mostra até os ossos - de quem escreveu e de quem lê!

 

O que proclamas,

quando deitada de bruços,

descansas o corpo,

fechas os olhos

e navegas em nuvens?

...

 E o Vitor, como que fazendo um testamento literário, continua, cirurgicamente, descobrindo - e escrevendo e descrevendo, suas lembranças, suas memórias afetivas, como nervos, como veias, uma a uma:

Acordei durante a noite

com a lembrança do teu corpo

...

Se reclinares o corpo dentro do rio

E deixares as águas te cobrirem,

Se te entregares à paisagem

E aceitares a densidade da mata

...

Se deres o sinal

conta comigo

para ararmos a terra.

...

 Já li o Vitor. Em prosa e em verso. Vitor agigantou-se, na mesma medida em que se mostra frágil ao falar de seus medos e suas aflições em sua narrativa poética:

Pousa tua mão

sobre o meu corpo

diz o meu nome

e me apunhala

...

Esse grito faca

hoje memória

esse barro  esperança

...

 Na sua Paisagem Marinha Vitor desenha suas partidas, suas idas, suas investidas em direção a um mundo desconhecido, suas saídas e chegadas...

E me faço navegador

como meu pai apontava

e teço redes de ternura

como a mãe ensinava

...

Cortei as amarras

para uma viagem sem rumo

cortei as amarras num dia de festa

enquanto o céu ardia

sem doer em meus olhos

...

 

Voltei para casa

para o principio do mundo

e as tuas pernas

me indicaram o caminho

...

E aí temos um Vitor-viajante-marinheiro-soldado, cansado da guerra, retornando à sua Ítaca. Pois, como já nos ensinou o professor Claudio Moreno, "o homem é um eterno Ulysses, sempre voltando para casa".

Me deves, Vitor, uma boa conversa sobre esse - e outros livros teus. Um dia, depois dessa verdadeira Odisseia em que vivemos, nos encontramos por aí...

(Ah, o meu uísque também é sem gelo!)


Vaz, neste momento, náufrago de uma paisagem marinha.

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(*) Luiz Carlos Vaz é Jornalista, Fotógrafo e Editor deste Blog


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