12 de julho de 2014

Salim saiu - uma reflexão sobre os 7 x 1



Cena clássica de um mercado oriental


"Salim saiu..." 

uma reflexão sobre os 7 x1



Eliana Valença (*)

Meu pai contava uma piada de que muito tenho lembrado nestes últimos dias, mas que desde ontem, não sai de minha cabeça. A piada é uma alusão bem humorada à conhecida aptidão para negócios e ao apego financeiro do povo libanês, que meu pai conhecia bem, vez que trabalhara para uma família cujos hábitos alimentares adquiriu, e de quem guardava, além das boas lembranças, as piadas, contadas sempre com muita riqueza de detalhes e alegria.

A piada conta que um rapaz entrou na lojinha do seu Salim e foi dizendo:

- Gostaria de falar com o seu Salim.
- Salim “saiu”, respondeu rapidamente o Salim, certo de que o rapaz fosse um cobrador.
- Que pena, disse o rapaz,  ele foi contemplado com um prêmio da nossa empresa...
Salim deu um pulo de dentro do balcão e gritou:
- Salim “soi eu”!!!!  Salim “soi eu”!!!!

Parece que essa história está acontecendo aqui com a Copa, só que às avessas...
Até ontem, havia uma avalanche massiva de postagens nas redes sociais sobre as maravilhas da Copa das copas. Era uma exaltação às pessoas de “bem” que sempre defenderam as inúmeras vantagens da Copa em nosso país, e alfinetadas nas pessoas do “mal”, que ainda tinham a coragem de argumentar contra a Copa  e  enumerar as prioridades que foram substituídas por estádios etc etc.

Mas era tanta e tanta questão que faziam de achar pais e mães para a realização da Copa, quanto as distribuições fartas de comentários ácidos contra quem apostava no fracasso do evento.

Então veio a tsunami... colocou no chão nossas “torres gêmeas”, quebrou nosso orgulho de país do futebol, varreu com as esperanças do Brasil ganhar, apagou o sorriso da cara do brasileiro, derrotou o país naquela característica que é a mais comum a todos (na opinião da maioria): o amor pelo futebol. E não foi apenas uma derrota, foi a Derrota das derrotas.

E aí começaram a buscar os culpados... e aí, minha gente, começaram os absurdos: a culpa é do Felipão, do Fred, da CBF, etc., inclusive um texto absurdo culpando a mídia golpista, vingança da FIFA, coibição dos brasileiros de torcerem para o Brasil etc. etc etc. E sem falar dos  comentários bem-humorados  que mostram bem o espírito dos brasileiros.
Quando tudo estava dando certo - e se o Brasil fosse campeão era só “Salim soi eu” - agora, que deu errado, é “Salim saiu”...

E agora é a hora de colocar a culpa em alguém... Poucos fizeram o “mea culpa” e talvez esses sejam os menos responsáveis pela derrota. Pouquíssimos admitiram a grandiosidade do time alemão, a determinação, a garra, a frieza e o equilíbrio emocional para não se abalar com toda a fama do time dono da casa, da torcida inflamada e em maioria esmagadora.  A Alemanha entrou no jogo na hora do jogo, com um time superior ao nosso e não tomou conhecimento do resto a não ser da sintonia de sua equipe. A impressão que tenho é que entraram determinados a fazer um gol no início para desestabilizar, mas... o nosso time desestabilizou, escorregou e perdeu o equilíbrio, como acontece em qualquer jogo. É jogo!!! E vi o capitão da Alemanha pedindo desculpas ao Brasil, já que nem eles esperavam por isso e não queriam humilhar o Brasil.

Não há o que fazer a não ser tirar disso uma lição, repensar uma série de coisas: a força do pensamento (positivo e negativo); a busca a qualquer custo da razão, de justificar qualquer erro nosso, e sempre achar um culpado “fora”; de usar a mesma lente deformada há anos para ver e analisar os fatos; de ler os acontecimentos sempre sob o aspecto partidário, pesando as coisas com o dedo na balança; educando nossos filhos para não serem responsáveis pelos possíveis erros, como se aí não estivesse um aprendizado, antigo, é verdade, mas sempre eficiente; a arrogância de sempre pensar que sempre vou fazer melhor do que o outro; o olhar distorcido de somente criticar a ideia e os fatos realizados pelos outros mesmo que tenham repetido uma atitude minha quando passando pela mesma situação; e por aí vai...

Pois o que poucas pessoas se dão conta quando direcionam o sucesso da copa para este ou aquele, é que muitos grupos de oração pediam e visualizavam em seus momentos de meditação, que tudo transcorresse em paz, sem tumultos, e isso aconteceu: o povo brasileiro mostrou-se hospitaleiro, alegre e com amor declarado a sua bandeira. E isso vai ficar! Puro mérito da índole do povo!!!

Fica a vergonha em sofrer uma derrota de tamanha dimensão para o futebol brasileiro. Mas a vergonha não é do Brasil, nem só dos jogadores ou do técnico.

A caça às bruxas vai continuar... os culpados vão ser amplamente  buscados e discutidos e os comentários arcaicos sob a lente de míopes, vão continuar...

Pois eu acho que aconteceu o que tinha que acontecer, o melhor para o Brasil!!! Difícil de entender, mas a minha intuição me diz que esse foi o melhor para o Brasil. O motivo, acho,  vai ser claro para alguns, daqui a um tempo. Para outros vai ser sempre inexplicável. E se fosse uma derrota comum, de 1x0, por exemplo, talvez eu não fizesse essa triste reflexão. Apenas estaria lamentando a derrota, lamentando como todo o brasileiro, ter perdido a Copa em casa. Mas o que me fez refletir, foi justamente o placar. É 7 a 1 !!!  Isso é um sinal gigante de PARE!!! PENSE!!!

E é isso que estou aqui fazendo.  Não entendo nada de futebol, mas entendo de ser humano! Estou tentando achar o aprendizado de tudo isso e não o possível culpado, sem me redimir de minha responsabilidade, sem responder que “Salim saiu”, se assim me for conveniente, ou “Salim sou eu”!!!

O Brasil é o país do futebol, mas também, o país da alegria, da arte popular, da música, da dança, da diversidade. Um dia isso também vai nos aglutinar em um grito único, e aí vamos ser invencíveis em realizações em todos os campos.

Para encerrar, uma Copa no Brasil que começou com aquela abertura desbotada, pobre e vazia terminou também num vazio imenso  para  nós, brasileiros.

E uma ideia surge agora, lá no fim do túnel:
Às vezes quando a gente perde, a gente ganha...
___________________
(*) Eliana é bageense, artista plástica e atua no magistério em  Pelotas; edita um blog onde publicou este texto.

2 comentários:

Anônimo disse...

Luizamigo

Belíssimo texto. Parabéns à Eliana. Acorda Brasil!

Abçs & qjs em especial para a Maribel.

Há Natália Correia na nossa Travessa. Resultado: o leão da Babilónia não é um leão, é uma leoa...

Venho informar-te que não virei mais aqui. pensei que me irias visitar e comentar - mas enganei-me. Assim só me resta dizer adeus e desejar boa sorte para Bagé.

Valença disse...

Nossa, estou realmente emocionada com tua generosidade com meu texto, Vaz! Obrigado, sr. Henrique que graças ao Vazamigo e à internet leu meu texto de além mar... Um abraço!