A memória de um fato
O dia da rua
No  dia da inauguração da placa da rua, o escritor, comovido, estava na  cidade entre os seus familiares e muitos de seus amigos. Escutou o texto  de uma carta, ouviu os discursos, concedeu autógrafos e falou de  improviso. Como sempre falou de maneira original e de forma  emocionalmente potente. Intelectual e corajosamente potente. Falou de  liberdade e da importância dos negros e do legado dos negros na  construção daquela magnífica cidade, preservada e tombada pelo  patrimônio histórico. Falou do resgate de uma honra ainda a ser  realizado e de sua necessária urgência.
O escritor  caminhou, feliz e reconhecido, com seus familiares e amigos e  autoridades e conterrâneos daquela cidade até o local da rua,  enfrentando o vento gelado que surrupiava mantas, boinas, bonés e  chapéus. Estava muito frio mas havia algum sol desenhando duramente os  volumes do casario e da esquina. Emoldurando o sol brilhante, estavam  também as volumosas nuvens escuras, que eram carregadas pelo vento na  direção do norte, ao centro do país. Na esquina, além da mureta branca e  do cais estava o rio, caudaloso, arisco e cinzento. Do outro lado da  ponte, a outra cidade, o outro país.
Disseram e o  escritor estivera lá no outro lado do rio veloz, alguns minutos antes e  fora a testemunha invonluntária do fato narrado. Disseram que caíra uma  chuva levissima, dançarina, de pequenos flocos de gelo. Naquela tarde  inesquecível, gelada, ensolarada e de ventania imprudente, nevou por  alguns instantes em Río Branco.
Naquele final de  tarde tão frio foram lançados dois livros do escritor, Contos de  Verdades e Uma terra só. Tudo isso foi verdade e porque a terra é uma  só, o escritor anotou que, precisamente naquele dia da rua e dos livros,  nevara em Jaguarão.
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2 comentários:
Por estas sortes da oportunidade sou testemunha de todos estes fatos, inclusive da neve.
De fato, Marcelo, a neve "selou" a impossibilidade de esquecermos esse dia fantástico.
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