5 de dezembro de 2010

A luz no fim do túnel - II, Trens na contramão

Esta foto [que vale por mil palavras] é de Alfredo Rodrigues.

NA CONTRAMÃO: O TRANSPORTE FERROVIÁRIO NO BRASIL, HOJE.
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...“Aproveitando-se do contexto e dos discursos a favor das concessões e privatizações, os interessados em assumir as empresas públicas passaram a incentivar a desregulamentação, a privatização e a concessão dos setores de utilidade pública, em nome da economia de mercado. Assim, o Brasil entraria no rol dos Estados ‘modernos e globalizados’. Esse discurso vai ao encontro dos interesses particulares de grandes corporações econômicas estrangeiras e nacionais, na intenção de assumir as empresas públicas por preços simbólicos, sem regras, sem limites de ganhos e sem compromisso social. Esse fato, segundo Murgel Branco (1997, p.A3) ‘é a própria negação dos princípios básicos da prestação de serviços públicos’,...”
Assim escreveu Márcio Rogério Silveira, em sua tese de doutorado “A Importância Geoeconômica das Estradas de Ferro no Brasil”, defendida na Universidade Estadual Paulista, em Presidente Prudente, SP. Não seria preciso complementar que foi “um crime” a privatização da malha ferroviária brasileira, mas - como muitas vezes afirmo em minhas narrativas – não resisti à tentação.
A falta de investimento em infraestrutura no setor por parte do, dito, Brasil da democracia e, anteriormente, o incentivo desmesurado ao transporte rodoviário, e um consequente desincentivo ao transporte ferroviário, feito pelo governo militar, fez com que, aos poucos, os nossos trilhos e dormentes, simbolicamente, enferrujassem e apodrecessem, respectivamente.
A RFFSA (Rede Ferroviária Federal Sociedade Anônima), criada em 1957, que unificou as 42 ferrovias então existentes, regionalizou-se em 18 setores, encampando por aqui a VFRGS (Viação Férrea Rio Grande do Sul). As primeiras locomotivas a diesel surgiram também nessa época, mas pelo que consigo lembrar, na linha Bagé-Cacequi elas só apareceram por volta de 1964, assim mesmo, alternando-se com as locomotivas a vapor, as chamadas “maria-fumaça”, bem mais vagarosas.
Enquanto nos países desenvolvidos o transporte ferroviário, por motivos econômicos óbvios, é incentivado através de investimentos em tecnologia e infraestrutura, por aqui não se vê nem a tal “luz no fim do túnel”. Em poder do capital especulativo, o sistema ferroviário brasileiro não foi contemplado, até hoje, com quaisquer melhorias na sua malha ferroviária que data do século XIX. Não há uma política séria voltada para reduzir, paulatinamente, o tráfego de caminhões pesados pelas grandes rodovias, o que só pode ocorrer com a reconfiguração generalizada da rede ferroviária do país, onde os caminhões se destinem somente para transportar frações de carregamentos dos locais de produção aos terminais das linhas férreas, cabendo às composições ferroviárias o transporte pesado a longas distâncias, até os portos marítimos, para exportação, e deles retornando, com os produtos importados.

O retrato do descaso. Isto é o que se pode comentar a respeito da estação ferroviária de Pelotas, RS. E é desta forma que se encontram a maioria das construções que constituíam as estações de trens [de passageiros] do Estado do Rio Grande do Sul. A composição estacionada junto à antiga plataforma de embarque é da empresa que comprou os direitos de uso da malha ferroviária desta região. Aparentemente não há relação entre a tal empresa e o prédio que constitui o patrimônio público que fazia parte da RFFSA. Por culpa das autoridades [em nível municipal, estadual e federal] e pela ação do tempo e do vandalismo, acham-se em ruínas históricos edifícios, que muito bem poderiam estar "na ativa", se o Brasil fosse, de fato, um país sério.
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Engº Sergio Fontana
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5 comentários:

José Doutel Coroado disse...

Concordo totalmente com a opinião divulgada neste post.
Nós, aqui em Portugal, cometemos o mesmo erro: prioridade ao rodo sobre o ferro.
No Brasil, dadas as enormes distâncias, ainda faz menos sentido. Isto para não falar das consequências a nível ambiental...
Ainda gostaria de perceber como é que o lobby do rodoviário tem tentáculos tão fortes e longos.
abs

Gerson Mendes Corrêa disse...

Trens na contra mão, esse foi um termo que certo presidente do Brasil usou, para entregar a preço de bananas um patrimônio imenso nas mãos da iniciativa privada. FHC primeiro sucateou o que pode a RFFSA, e eu posso dizer que vivi nesse olho de furacão por longos 19 anos, 16 anos na RFFSA e três anos na ALL. Nos tempos da RFFSA tínhamos um total de 20 trens diários de Rio Grande a Cacequí, sendo 10 de cada lado, de Rio Grande trem com vagões vazios, adubo e combustível para Bagé, e mais cimento que adicionava na fábrica em Hulha negra para todo o estado, e de Cacequí vinham todos carregados com, trigo, soja e insumos para as fábricas de adubo em Rio Grande.
Quando esta gente despreparada da ALL assumiu a media de trens nesse trecho diminuiu drasticamente, e hoje tem dois trens por dia, um que vai e outro que vem.
Para que vocês tenham uma idéia do desmanche, as primeiras cabeças que rolaram foi o pessoal de manutenção da via, e como a manutenção quase não existia começou a pipocar acidentes graves, então eles se obrigaram a contratar serviço de manutenção particular, organizado por aquele pessoal que foi demitido. Isso aconteceu com as oficinas.
Depois foram desativando ramais importantes, como por exemplo, na região Cruz Alta, ramais que alimentavam esta com soja, milho, trigo, para então seguir viagem para o porto de Rio Grande e para moinhos como em Porto Alegre. Nesses ramais os trilhos foram roubados, as estações grande patrimônio da União, todo demolido e roubado.
A perda em valores imobiliários foi muito maior. Imaginem o seguinte: pelo lado de fora de cada trilho tem uma faixa de terra de 15 metros que pertencia à União.
Isto sem contar com outros desatinos gerenciais que outra hora eu conto.

Luiz Carlos Vaz disse...

Olha só Sérgio, um ex-ferroviário do Estadual e uma pessoa que mora na Europa, pensam a mesma coisa. Parabéns! Vamos lá, vamos colocar os trens nos trilhos...

Sérgio Fontana disse...

Meu caro Luiz Carlos Vaz, eu pouco acredito em iniciativas do governo brasileiro que visem restabelecer o transporte ferroviário aos moldes relatados pelo nosso colega Gerson (que eu acho que também estudou no Auxiliadora, nos seus tempos de ginásio). Creio, isto sim, na divulgação paulatina de um movimento popular que chegue, talvez ao acaso, ao conhecimento dos meios de comunicação que se dedicam a fazer um jornalismo com credibilidade, os quais têm o poder de influenciar e até pressionar os governantes em suas tomadas de decisões.
Ainda quero poder viajar de trem, de novo.
Grande Abraço.

Gerson Mendes Correa disse...

Olha, assim como o Sergio Fontana eu duvido do apoio governamental ao transporte ferroviário de carga e passageiros, como por exemplo o modelo europeu, haja visto a demora e a enrrolação para que o "Trem bala" entre Rio e São Paulo, saia do papel. Hoje o loby do transporte no brasil é totalmente rodoviário.
A RFFSA como num último suspiro em 1996 criou trens especiais, e cito aqui dois deles:
1º O trem da cerveja, a Fabrica da brahma carregava em containers o equivalente a 24 carretas e esses containers por sua vez, eram embarcados em um trem con 12 plataformas, com tres locomotivas onde súma trabalhava,as outras duas eram reservas, no pátio de Diretor Pestana, que era a estação de Porto Alegre, a qual fica em frente ao aeroporto Salgado Filho, dali seguia para Uruguaiana, onde passava por um transbordo para um trem argentino, isso se dava duas vezes por semana, só parava cinco minutos para troca de maquinistas e se uma locomotiva tivesse avarias, era só desliga-la e ligar outra.
2º Teve também um trem especial que saia de São Paulo e corria até Rio Grande, que ninguém definia a carga para evitar roubos, no entanto o comentário era de ser produtos eletrodomesticos da Brastemp, e voltava com arroz para São Paulo, inclusive cada parada tinha que ser muito esclarecida.
Mas como a entrega da ferrovia foi para o Grupo Oportunity e entre eles estava a cervejaria Brahma, o primeiro trem a morrer foi o da cerveja, os outros foi uma questão de tempo.
Caro Sergio eu estudei dois anos no Colegio Auxiliadora, o 4º e 5º, de repente estudamos juntos, um baita kebra kostelas indio véio.